Não cessam, e não cessarão, por um
bom tempo, notícias sobre a corrupção no cenário administrativo-político do
Brasil.
Atingimos o clímax de processo de
deteriorização e podridão de sistema político, evidentemente falido.
Falido porque, fundamentalmente, a
política partidária traveste-se, no nosso País, em forma despudorada de
enriquecimento pessoal e criminoso.
Motivador para a permanência desse
quadro é o instituto da reeleição indefinida e da familiarização dos quadros
políticos.
Com efeito, torna-se cada vez mais
comum não só a sucessão de avós, pais e filhos, e mesmo cônjuges, na herança de
mandato popular, como também o desempenho simultâneo de cargos eletivos a
retratar a constituição de feudos familiares no açambarcamento e monopólio da
representação política.
É preciso que se dê “basta” a esse quadro profundamente
deletério e, claramente, atentatório à democracia, regime que se notabiliza
justamente por estimular e ensejar a alternância dos detentores de mandatos
eletivos.
Cabe, aqui, realçar o magistério da
Doutrina Social da Igreja a dizer sobre “as tarefas da comunidade política”:
“168. A responsabilidade de perseguir o bem comum compete não
só às pessoas consideradas individualmente, mas também ao Estado, pois que o bem comum é a razão de ser da
autoridade política. Na verdade, o Estado deve garantir coesão, unidade e
organização à sociedade civil de que é expressão, de modo que o bem comum possa
ser conseguido com o contributo de todos os cidadãos. O indivíduo humano, a
família, os corpos intermédios não são capazes por si próprios de chegar a seu
pleno desenvolvimento; daí serem necessárias as instituições políticas, cuja
finalidade é tornar acessíveis às pessoas os bens necessários – materiais,
culturais, morais, espirituais – para levar uma vida verdadeiramente humana. O fim da vida social é o bem comum
historicamente realizável.” (leia-se: Compêndio da Doutrina Social da
Igreja nº 168 – pg. 103 – edições Paulinas, grifei).
E prossegue esse Documento:
“169. Para assegurar o bem comum, o governo de cada País tem
a tarefa específica de harmonizar com justiça os diversos interesses setoriais.
A correta conciliação dos bens particulares de grupos e de indivíduos é uma das
funções mais delicadas do poder público. Além disso, não se há de olvidar que,
no Estado democrático – no qual as decisões são geralmente tomadas pela maioria
dos representantes da vontade popular -, aqueles que têm responsabilidade de
governo estão obrigados a interpretar o bem comum do seu País não só segundo as
orientações da maioria, mas também na perspectiva do bem efetivo de todos os
membros da comunidade civil, inclusive dos que estão em posição de minoria”.
(documento citado nº 169 – pg. 103).
Deploravelmente, o que o
exercício da política partidária brasileira, e já por décadas, nos mostra é a
desenfreada exaltação do bem pessoal – negociatas contínuas, contas bancárias e
utilização de mecanismos financeiros no exterior, superfaturamento de obras
públicas a que se locupletem empresários e políticos – eliminado qualquer
compromisso na promoção do bem comum.
Torno ao magistério do
Compêndio da Doutrina Social da Igreja, e reproduzo:
“Nesta perspectiva, torna-se imprescindível a exigência de
favorecer a participação, sobretudo dos menos favorecidos, bem como a alternância dos dirigentes políticos a
fim de evitar que se instaurem privilégios ocultos; é necessária ademais
uma forte tensão moral para que a gestão da vida pública seja fruto da
co-responsabilidade de cada um em relação ao bem comum”. (documento citado nº
189 – pg. 114).
Sim, “os privilégios ocultos” estão sendo
postos às claras. É imperativo que tal perdure porque atitude inerente à
democracia.
Eis porque também no
âmbito judicial, salvo a que se resguarde a intimidade das pessoas em litígio –
o que, por óbvio, não pode ser considerado quando essas pessoas assumem
condutas no desempenho de função pública -, lugar não há para que investigações
e processos, mormente de natureza criminal, permaneçam ocultos.
Insisto: é marca
inegociável da democracia a publicidade em tudo o que diga respeito ao bem
comum.
A partir de frase que
disse – “Pecadores, sim. Corruptos, não” – o Papa Francisco foi questionado
pelo jornalista Andrea Tornielli e respondeu:
“A corrupção é o pecado que, em vez de ser reconhecido como
tal e de nos tornar humildes, é
transformado em sistema, torna-se um hábito mental, um modo de viver. Não
nos sentimos mais necessitados de perdão e de misericórdia, mas justificamos a
nós mesmos e aos nossos comportamentos. Jesus diz aos seus discípulos: se
alguém te ofende sete vezes ao dia e sete vezes volta a ti para pedir perdão,
perdoa-lhe. O pecador arrependido, que depois cai e recai no pecado por causa
de sua fraqueza, encontra novamente perdão, desde que se reconheça necessitado
da misericórdia. O corrupto, ao
contrário, é aquele que peca e não se arrepende, aquele que peca e finge ser
cristão, e com a sua vida dupla provoca escândalo”. (leia-se: O nome de
Deus é misericórdia – pg. 117/118 – editora Planeta, grifei).
E conclusivo:
“A corrupção não é um ato, mas uma condição, um estado
pessoal e social no qual a pessoa se habitua a viver... O corrupto é aquele que
se indigna porque lhe roubaram a carteira e se lamenta pela falta de policiais
nas ruas, mas depois engana o Estado, sonegando impostos, e talvez demitindo os
empregados a cada três meses para evitar contratá-los por tempo indeterminado,
ou então possui trabalhadores não registrados. E depois conta vantagem de tudo
isso diante dos amigos. É aquele que talvez vá à missa todo domingo, mas não vê
nenhum problema em aproveitar a sua posição de poder, para exigir o pagamento
de propinas. A corrupção faz perder o
pudor que protege a verdade, a bondade, a beleza.” (livro citado pg.
120/121, grifei).
“A verdade, a bondade e a beleza” concedeu-me Deus no sábado 28 de
maio vivenciá-las por algumas horas quando me decidi, na companhia de algumas
irmãs e irmãos da fraternidade franciscana, dirigir-me à área, aqui em
Brasília, conhecida como: “o Lixão da Estrutural”.
Ali convivemos com irmãs
e irmãos que sobrevivem dos resíduos do lixo – são catadores de lixo – e lhes
entregamos, porque merecem, 450 quentinhas de arroz com frango, e feijão, e
doces e refrigerantes: a comida que preparamos desde cedo, ofertada de coração.
Trocamos breves palavras, e sorrisos sinceros, e gestos fraternos e oramos o
Pai Nosso. Até a saudação vascaína, ao ver irmãzinha com o gorro de nosso
clube, ali ecoou.
Essa manhã-tarde de
sábado não vou deixá-la extinguir-se em mim. É sopro do Espírito Santo para que
vá além do que possa ir.
Um comentário:
Por favor, escreva sobre o perdão de Assis E o seu oitavo Centenário.
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