quarta-feira, 8 de março de 2023

LISTA TRÍPLICE

 

                                           

 

É tema que tem aflorado na mídia, com certa insistência, saber se a lista tríplice, elaborada pelos membros do Ministério Público Federal, deve limitar o campo de ação do Presidente da República na escolha da/o Procuradora/or – Geral da República.

O tratamento dessa matéria, assim exclusivamente focado na lista tríplice, conduz-nos a grave equívoco.

Por que?

Porque o centro correto das discussões não reside no dado único e isolado da lista tríplice.

O centro das discussões está no como garantir a efetividade do princípio da independência funcional, constitucionalmente posto no §1º, do artigo 127, de nossa Constituição Federal para que os membros do Ministério Público, mormente a/o Procuradora/or – Geral da República, cumpram, sem subserviência, sem motivações subalternas, sem deliberadas omissões com a missão de defesa da Democracia e, portanto, dos interesses coletivos e individuais indisponíveis, vale dizer: da promoção do bem comum.

Isso assentado, óbvia a conclusão de que a forma de escolha da/o Procuradora/or – Geral da República, como presente no § 1º, do artigo 128, de nossa Constituição Federal, muito longe está de garantir efetividade ao princípio da independência funcional em relação a/o Procuradora/or – Geral da República.

Por que?

Porque o retro mencionado preceito constitucional entrega, solitária e exclusivamente, ao Presidente da República o escolher “dentre os integrantes da carreira” do Ministério Público da União a/o Procuradora/or- Geral da República.

Breve parêntesis: “integrantes da carreira” pressupõe as/os que estejam em pleno exercício funcional. Aposentadas e aposentados, portanto, por não mais integrarem a carreira, porque dela se desligaram, voluntária ou compulsoriamente, não são legitimados ao exercício desse cargo. Simples assim, sem lugar a malabarismos jurídicos.

Fechado o parêntesis, tornamos a ver o Presidente da República dotado de poder absoluto de escolha à chefia da Instituição, que, todavia, não se incrusta, por qualquer modo, no organograma do Poder Executivo. Instituição, portanto, que não é do governo, mas vocaciona-se à defesa da Sociedade brasileira, inclusive controlando a constitucionalidade e a legalidade dos atos governamentais, eis que expressa é a parte final, do artigo 127, da Constituição Federal:

“Artigo 127 - ... incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático, e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”.

Como corrigir essa clara anomalia?

Fazendo valer, então, o princípio da independência funcional e assim,  modificando a redação do §1º, do artigo 128, da Constituição Federal, a que fique por bem expresso que:

- seja vedada a recondução de quem no exercício do cargo de Procuradora/or – Geral da República, que só exercerá esse cargo por 3 anos;

- seja vedada, durante o desempenho do mandato trienal, ou após a cessação desse desempenho, a designação para outro, e qualquer, cargo público;

Compondo esse quadro, agora sim e por coerência, limite-se que a escolha do Presidente da República recaia sobre um dos nomes que figure na lista tríplice, elaborada pelos integrantes da carreira do Ministério Público Federal.

Mas, por quê? Porque se limitar a elaboração da lista tríplice aos membros do Ministério Público Federal?

Aqui, permito-me convidar a leitora e o leitor a conhecer artigo que escrevi, intitulado: “A independência funcional: garantia constitucional da missão definida ao Ministério Público” e que pode ser lido no blog do Claudio Fonteles.

 

terça-feira, 20 de dezembro de 2022

POR QUE SEMPRE ACONTECE O NATAL?

 

                  

 

Meditando sobre o significado do Natal, detive-me no porquê de sempre acontecer e escrevi essas palavras:

“O Deus-Amor nasce, a cada ano, justo para nos ensinar que não há ponto final porque somos seres extáticos, sempre saindo de nós mesmos para o encontro com os outros, todas e todos, irmãs e irmãos, e não seres estáticos, imobilizados e centrados em preconceitos de toda natureza”.

O Deus-Amor não permanece no mais alto dos céus.

Não.

Ele vem até nós; nos procura; nos chama; precisa de nós porque todo amor é comunicação, jamais solidão, e, assim, já nos ensina a viver.

Sua missão é ensinar, propondo-se a nós, jamais impondo-se porque todo amor é proposta, convite, e não imposição, comando.

Ensina-nos que “não há ponto final” daí porque seu nascimento acontece, e sempre acontecerá, enquanto vida humana houver sobre a face da terra.

Também “não há ponto final” porque “todo amor é extático” como disse um dia, num belo dia, o padre Paul Eugène Charbonneau. Com efeito, quem ama, verdadeiramente, não se contém. Necessita abrir-se; necessita oferecer-se; necessita envolver-se em família, em grupo, em sociedade.

O êxtase nos impele a sair de nós mesmos.

Gosto de dizer que “Jesus é o êxtase de Deus para a humanidade”, para nós, suas criaturas, assim tão eloquentemente por Ele amadas.

E “saímos de nós mesmos para o encontro com os outros, todas e todos, irmãs e irmãos” porque a fraternidade é a nossa meta, principalmente como cristãos.

Extraio de Piero Coda, no seu artigo “Por uma fundamentação teológica da categoria política da fraternidade”, essas palavras:

 

“1. A fraternidade é uma categoria essencialmente cristã, no sentido de que aprofunda suas raízes no evento de Jesus Cristo e, a partir desse evento, abre caminho na história. Na realidade, é impressionante a marcada presença de termos como adelphós (irmão), adelphótes (fraternidade), philadelphia (amor fraterno) no Novo Testamento. Chama a atenção, de modo especial, que adelphói (irmãos) seja o termo com o qual os próprios discípulos de Cristo se denominam e que o substantivo adelphótes (fraternidade; cf. 1Pd 2, 17; 5,9) não signifique um ideal a ser conquistado, mas uma realidade alcançada, uma dádiva recebida com a qual a existência e as relações entre os cristãos se identificam. Em outras palavras, a fraternidade é a peculiaridade da comunidade cristã, a atuação da novidade realizada por Jesus e, com isso, o fermento chamado a levedar, internamente, a massa de toda a humanidade”. (leia-se: O Princípio Esquecido – pg. 77, grifos do original).

E, pontuando perspectiva sociopolítica da fraternidade, afirma:

“A segunda consequência é que Jesus crucificado e abandonado mostra o único lugar a partir do qual pode nascer e se articular uma autêntica prática de fraternidade: a partilha com quem, de algum modo, é marginalizado e excluído. Expressões como “bem-aventurados os pobres...” e “o que fizeste ao menor, a mim o fizeste” não são simples modos de dizer. Pelo contrário, indicam que a fraternidade nasce somente a partir de baixo, do identificar-se, fazer-se um com os menores, porque Cristo se colocou nessa posição. E seria completamente ilusório e historicamente ineficaz acreditar que se possa estabelecer uma fraternidade prescindindo dessa medida, sempre de novo confrontada com o aspecto concreto do semblante de quem sofre”. (livro citado – pg. 81 – grifos do original).

O autocrata se imobiliza. Centra-se hermeticamente. Manipula e disfarça. É um mito, portanto uma mentira.

Abomina o ensino, a cultura, a arte, a ciência.

 

 

Não dialoga porque é parco de ideias e de palavras.

Refletindo sobre o que chamou “Uma Nova Cultura”, o Papa Francisco, e principiando por rememorar frase tão lúcida de nosso poeta Vinicius de Moraes –“A vida é a arte do encontro embora haja tanto desencontro pela vida” -, bem ensina:

“215. “A vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro na vida”. Já várias vezes convidei a desenvolver uma cultura do encontro que supere as dialéticas que colocam um contra o outro. É um estilo de vida que tende a formar aquele poliedro que tem muitas faces, muitos lados, mas todos compõem uma unidade rica de matizes, porque “o todo é superior à parte” (EG n. 273). O poliedro representa uma sociedade em que as diferenças convivem integrando-se, enriquecendo-se e iluminando-se reciprocamente, embora isso envolva discussões e desconfianças. Na realidade, de todos se pode aprender alguma coisa, ninguém é inútil, ninguém é supérfluo. Isso implica incluir as periferias. Quem vive nelas tem outro ponto de vista, vê aspectos da realidade que não se descobrem a partir dos centros de poder onde se tomam as decisões mais determinantes”. (leia-se: Carta Encíclica Fratelli Tutti sobre a Fraternidade e a Amizade Social – pg. 112).

O fim do ano de 2022, em nosso Brasil, marca o fim de um ciclo quadrienal que há de ser lembrado para ser esquecido.

Que renasça em nós, brasileiras e brasileiros, a alegria sadia, a firme leveza no acontecer diário, o diálogo respeitoso e fundamentado nas posições divergentes, enfim que a fraternidade não seja palavra escrita, ou dita, mas que vivida seja.

 

                                                                  Paz e Bem. Feliz Natal!    

  

 

 

quarta-feira, 19 de outubro de 2022

"ESCUTAR E RESPEITAR"

 

                                

 

Os autocratas de todos os matizes, centrados no egocentrismo doentio, fingem escutar, quer só escutando os que lhe são subservientes, quer não escutando os que se lhes apresentam para o diálogo seguro e construtivo.

Não respeitam, menosprezam. Atacam e satanizam, fazendo do opositor não o adversário a ser ouvido, mas o inimigo a ser destruído.

Apontando, objetivamente, caminhos, disse o Papa Francisco:

“Sublinhei a vocação do Cazaquistão a ser País do encontro: com efeito, nele convivem cerca de cento e cinquenta grupos étnicos e falam-se mais de oitenta línguas. Esta vocação, que se deve às suas características geográficas e à sua história – esta vocação de ser país de encontro, de cultura, de línguas – foi acolhida e abraçada como um caminho, que merece ser encorajado e apoiado. Também formulei votos para que ela possa prosseguir a construção de uma democracia cada vez mais madura, capaz de responder eficazmente às necessidades da sociedade como um todo. É uma tarefa árdua, que leva tempo, mas já se deve reconhecer que o Cazaquistão fez escolhas muito positivas como a dizer não às armas nucleares e a de boas políticas energéticas e ambientais. Isto foi corajoso. Num momento desta trágica guerra onde alguns pensam em armas nucleares – uma loucura – este país já desde o início disse não às armas nucleares”. (Palavras do Papa Francisco na Audiência Geral do dia 21 de setembro passado, na Praça de São Pedro, grifos do original).

“Fazer escolhas muito positivas, como dizer não às armas nucleares e a de boas práticas energéticas e ambientais”.

Sim, o encontro propicia o abandono das táticas de supremacia belingerante e a inserção no convívio enriquecedor da alteridade. O encontro também nos ensina que habitamos a casa comum, presente do Deus-Amor, presente que se descobre no perene cuidado para com os cenários vivos da natureza, que nos acolhe, abriga e alimenta.

 

Recordo-me, aqui, das estrofes iniciais da canção “Irmão Sol, Irmã Lua”, ode à pessoa maravilhosa que foi, é e sempre será em nossos corações, Francisco de Assis, estrofes assim apresentadas:

“Doce é sentir

em meu coração

humildemente

vai nascendo o amor

Doce é saber

não estou sozinho

sou uma parte

 de uma imensa vida

que generosa

reluz em torno a mim”.

No entanto, estamos a presenciar a estupidez da guerra Rússia-Ucrânia.

O mais grave: passado o momento da comoção coletiva, dita guerra cristalizou-se no nosso cotidiano e famílias continuamente despedaçadas, vidas seguidamente desfeitas, êxodo permanentemente dilacerante não nos incomodam porque não mais motivam o noticiário e, descuidados com o que acontece, simplesmente deletamos o que não nos atinge.

Como dizer que a guerra, ou conflitos aos pedaços, não nos atinge porque, geograficamente, longe de nós, ou mesmo restrita a espaço delimitado?

Eis a mais nítida constatação da insensibilidade, expressa no fechamento xenófobo, que dissemina o preconceito, o ódio, a violência a caracterizar comportamentos pessoais e coletivos.

Mais uma vez as palavras do Papa Francisco, na Audiência já aqui mencionada, como que partilhando a experiência que viveu por ocasião do 7º Congresso de Líderes das religiões mundiais e tradicionais, acontecido no Cazaquistão:

Disse o Papa:

“Esta iniciativa realiza-se há vinte anos pelas Autoridades do país, que se apresenta ao mundo como lugar de encontro e de diálogo, neste caso a nível religioso e, portanto, como protagonista na promoção da paz e da fraternidade humana. Foi a sétima edição deste congresso: um país que tem 30 anos de independência, realizou já 7 edições destes congressos, um a cada três anos. Isto significa colocar as religiões no centro do compromisso para a construção de um mundo onde nos escutamos e respeitamos na diversidade. E isto não é relativismo, não: é escutar e respeitar (trecho lido na Audiência Geral de 21 de setembro – grifos meus).

É fundamental que mulheres e homens de boa vontade, congregados, ou não, em religiões, mas todas e todos congregados, vocalizem e atuem em congressos, declarações, passeatas celebrativas, exercitando e assumindo, portanto e concretamente, comportamentos e atitudes que resgatem, realçando e comprometendo-se, também em protagonismo, com o destino da humanidade, que não pode ser monopolizado pelo poder econômico-tecnocrático, que instrumentaliza, sobrepondo-se e servindo-se, a atividade política, assim amesquinhada.

Encerro, transcrevendo, muito a propósito, a conclusão da Declaração firmada pelo Papa Francisco e por Ahmed Al-Tayyeb, Grão Iman de Al-Azhar, em Abu Dabhi, no dia 4 de fevereiro de 2019:

“Ao concluir, almejamos que esta Declaração:

Seja um convite à reconciliação e à fraternidade entre todos os crentes, mas ainda entre os crentes e os não-crentes, e entre todas as pessoas de boa vontade;

Seja um apelo a toda consciência viva que repudia a violência aberrante e o extremismo cego; um apelo a quem ama os valores da tolerância e da fraternidade, promovidos e encorajados pelas religiões;

Seja um testemunho da grandeza da fé em Deus, que une os corações e eleva a alma humana;

Seja um símbolo do abraço entre o Oriente e o Ocidente, entre o Norte e o Sul e entre todos aqueles que acreditam que Deus nos criou para nos conhecermos, cooperarmos entre nós e vivermos como irmãos que se amam.

Isto é o que esperamos e tentaremos realizar a fim de alcançar uma paz universal de que gozem todos os homens nesta vida. (grifos do original).

 

                                                        Paz e Bem.

 

  

 

quinta-feira, 29 de setembro de 2022

 

                           POR QUE LULA É INOCENTE?

                                                                              

                                                             Claudio Fonteles                    

    

A indagação é pertinente.

Pertinente porque o manejo do tema corrupção para denegrir sua pessoa é avassalador nas chamadas redes sociais, espaço recente e aberto a toda a sorte de manipulação das pessoas.

Enfrentando, então, a indagação, a primeira linha de raciocínio conduz-nos ao exame do comportamento funcional do juiz e do membro do Ministério Público, na área federal chamado procurador da República.

Fundamental que aquela, ou aquele, investidos da relevante missão de julgar as pessoas e os fatos, que cometem, dotem-se, comprometam-se, nessa missão de extrema responsabilidade pessoal e comunitária, mantendo-se fiéis àquilo que lhes é próprio: serem imparciais, vale dizer, dispam-se de qualquer subjetivismo impregnado de emoções, de qualquer partidarismo, para que, harmônicos em postura isenta, assim, consciente e motivadamente, bem decidam tudo o que lhes é dado julgar,

Fundamental, outrossim, que aquela, ou aquele, investidos da igualmente relevante missão de acusar alguém em juízo pela prática de condutas delituosas contra o bem público, façam-no na exposição objetiva e coerente dos fatos, sem estrelismos, sem encantos midiáticos.

Cada qual, juiz e procurador da República, no âmbito de suas específicas atribuições.

Jamais dialogando um com o outro, reservadamente, sobre a questão judicial posta e sobre a pessoa, objeto da questão judicial posta.

O que se viu, o que é inconteste, tendo, inclusive, a chancela de nossa Suprema Corte foi que o então juiz federal Sergio Moro e o então procurador da República Deltan Dallagnol entabularam, entre si, conversas várias sobre Luiz Inácio Lula da Silva no decorrer do processo criminal que o último movera contra Luiz Inácio, e o primeiro conduziu e julgou.

Eloquente a suspeição do juiz, eloquente que o procurador da República, que deveria zelar pela correta aplicação da lei, descumpriu com o princípio processual do contraditório, que garante o pleno equilíbrio das partes no processo judicial.

O processamento criminal e a condenação de Luiz Inácio Lula da Silva não se sustentam porque conduzido, e decidido, por juiz suspeito.

Dir-se-á: mas as instâncias revisoras dessa decisão, mantiveram-na. Então, ela vale.

Não.

Tal raciocínio é sofisma.

As instâncias revisoras, que o processo percorreu, são, como disse, revisoras.

Elas se debruçam sobre o que foi feito perante e sob a condução do juiz. Elas não produzem provas sobre os fatos. Provas sobre os fatos são, unicamente, produzidas pelas partes ante o juiz.

Ora, se esse juiz se conduz, flagrantemente violando o impostergável atributo da imparcialidade, o que aconteceu mesmo, então toda a sua direção processual e o que decidiu quedam nulo de pleno direito e, se a nulidade é plena, não pode ser sanada em hipótese alguma.

Registro necessário: as condutas supervenientes do juiz Sergio Moro, aceitando cargo de relevo na administração do mais ferrenho opositor de Luiz Inácio Lula da Silva; lançando-se à disputa eleitoral para o cargo de senador da República e, sob essa perspectiva, notabilizando-se como ferrenho opositor a Luiz Inácio Lula da Silva são fatos claros e óbvios a caracterizar, inequivocamente, sua parcialidade, confirmando o acerto da conclusão por sua suspeição.

Por outra perspectiva de abordagem do tema aqui versado, é de se perguntar: quais fatos em relação a Luiz Inácio Lula da Silva, e mesmo seus familiares, significam sinais ostensivos de riqueza?

Onde estão os imóveis comprados com dinheiro vivo a indicar lavagem de dinheiro?

Onde estão carros, lanchas e jatos particulares?

Onde estão fazendas?

Onde a prática da “rachadinha” quando exerceu o mandato de deputado federal?

Lançar fake news a propósito, de nada vale.

Por que não se apresenta documentação hábil a tudo isso provar?

Vou encerrar com palavras plenas de sentido do Papa Francisco a propósito dos Movimentos Populares, escritas no Capítulo V, que intitulou “A Melhor Política”, de sua Carta Encíclica “Fratelli Tutti”:

169. É necessário pensar a participação social, política e econômica segundo modalidades tais que incluam os movimentos populares e animem as estruturas de governo locais, nacionais e internacionais com aquela torrente de energia moral que nasce da integração dos excluídos na construção do destino comum e, por sua vez, incentivar para que estes movimentos, estas experiências de solidariedade que crescem debaixo, do subsolo do planeta, confluam, sejam mais coordenados, se encontrem. Mas fazê-lo sem trair o seu estilo característico, porque são semeadores de mudança, promotores de um processo para o qual convergem milhões de pequenas e grandes ações interligadas de modo criativo, como em uma poesia. Nesse sentido, são poetas sociais que, à sua maneira, trabalham, propõem, promovem e libertam. Com eles, será possível um desenvolvimento humano integral, que implica superar a ideia das políticas sociais concebidas como uma política para os pobres, mas nunca com os pobres, nunca dos pobres, e muito menos inserida em um projeto que reúna os povos. Embora incomodem e mesmo que alguns “pensadores” não saibam como classifica-los, é preciso ter a coragem de reconhecer que sem eles a democracia atrofia-se num nominalismo, uma formalidade, perde representatividade, vai-se desencarnando, porque deixa fora o povo em sua luta diária pela dignidade, na construção de seu destino”. (Carta Encíclica Fratelli Tutti nº 196 – pg. 90/91).

Voto em Luiz Inácio Lula da Silva porque é a oportunidade real de sermos: poetas sociais.

                                                            Paz e Bem.      

                                                            

 

quarta-feira, 24 de agosto de 2022

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

 

                                    

 

Tem estado o Supremo Tribunal Federal de nosso Brasil no noticiário recorrente, fruto do embate que com essa Instituição trava o presidente da República Jair Bolsonaro, desde que assumiu o governo.

Analisemos esse quadro.

Como estabeleci acima, e isso se constitui em fato notório, desde os momentos iniciais do governo, e por todo esse período, o presidente Jair Bolsonaro não cessa de atacar a Instituição Supremo Tribunal Federal e magistrados dessa Corte.

Não o faz, em absoluto, fundamentado em postura equilibrada, necessariamente fundamentada no que veicula, e em divergência respeitosa.

Seu comportamento é belicoso e arbitrário.

Prega, então, o fechamento do Supremo Tribunal Federal; destrata, grosseiramente, magistrados que o compõem; proclama, em tom de ameaça explícita, que não cumprirá decisões da Corte, quando assim o entender.

O Estado Democrático de Direito assim o é não só porque no elenco de direitos e deveres, assentados individual e coletivamente, disso faz-se garantidor; também por estabelecer, na separação dos poderes republicanos de governar, legislar e julgar, o antídoto eficaz contra qualquer tentativa de autocracia ditatorial; e, mais ainda, por constituir o Poder Judiciário, na presença de seu órgão máximo – o Supremo Tribunal Federal – o guardião da Constituição como está claramente posto no artigo 102 da Constituição Federal de nosso País.

Pôr-se, autoritária e desmotivadamente, contra esse ordenamento jurídico é atentar contra o Estado Democrático de Direito.

E por que digo: “autoritária e desmotivadamente”?

Porque se as decisões judiciais proclamadas hão de ser por todos cumpridas, todavia, e justo porque o regime democrático é o caminho único e perene para a permanente discussão do que se faz e porque se faz, as decisões judiciais abrem-se como tudo, insisto, na Democracia, ao juízo crítico.

O juízo crítico, contudo, e repetindo o que afirmei linhas atrás, manifesta-se “em postura equilibrada, necessariamente fundamentada no que veicula e em divergência respeitosa”.

Ora, o presidente Jair Bolsonaro centra-se em comportamento “belicoso e autoritário” porque “prega o fechamento do Supremo Tribunal Federal; destrata, grosseiramente, magistrados que o compõem; proclama, em tom de ameaça explícita, que não cumprirá decisões da Corte, quando assim o entender”.

É certo que de par com esse quadro, notório, que traço, o presidente Jair Bolsonaro escora-se no que diz ser: “sua liberdade de manifestação do pensamento”.

O inciso IV, do artigo 5º, da Constituição Federal preceitua:

“IV – é livre a manifestação do pensamento sendo vedado o anonimato”.

De plano, tenha-se por bem presente que o inciso IV veda o anonimato no exercício da manifestação do pensamento. Assim o faz porque a manifestação da liberdade de pensamento não se absolutiza a ponto de legitimar o falar o que eu quero; como eu quero; quando eu quero.

Nesse sentido, textual o inciso seguinte, o inciso V, do mesmo artigo 5º a estabelecer que:

“V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”.

Portanto, o abuso, por parte de quem quer que seja, no exercitar a livre manifestação do pensamento perfaz-se em comportamento ilícito e, no caso do Presidente da República, a teor do que está cristalino nos incisos do artigo 85 da Constituição Federal, o abuso configura crime de responsabilidade porque significa “atentar, especialmente, contra o livre exercício do Poder Judiciário” (artigo 85, II) e “o não cumprimento de decisões judicias” (artigo 85, VII).

Outro ponto, avivado nos dias recentes pelo presidente Jair Bolsonaro e seguidores e direcionado ao Ministro Alexandre de Moraes, acoima de ilegal o comportamento do Ministro Alexandre de Moraes por violar o sistema acusatório na persecução penal.

O sistema acusatório na persecução penal está consagrado, efetivamente, no artigo 129, inciso I, da Constituição Federal e erige, exclusivamente, o Ministério Público brasileiro – Instituição da sociedade brasileira – a legitimar-se para acusar alguém ante o Poder Judiciário pela prática de conduta criminosa.

Por esse sistema não se confundem, mantendo-se independentes entre si, as atividades de acusar, como dito acima atribuída exclusivamente aos membros do Ministério Público, e de julgar, estas conferidas, exclusivamente, aos magistrados.

Eis porque, e para bem cumprir com tão relevantes funções, aos membros do Ministério Público garante-se-lhes a independência funcional - § 1º do artigo 127 da Constituição Federal – e aos magistrados o dever de imparcialidade.

Na medida, então, que se imiscui o magistrado em tarefas investigatórias, que precedem a conclusão por acusar-se, ou não, alguém, ao arrepio do membro do Ministério Público, o magistrado, então, desnatura o sistema acusatório.

Em tese, efetivamente, assim o é.

Mas, vamos aos fatos.

Indagação imprescindível deve ser colocada: por que não só o Ministro Alexandre de Moraes, mas magistrados outros do Supremo Tribunal Federal têm determinado a realização de atos no curso de investigação criminal e mesmo exercido juízo de controle sobre o modo de atuar do procurador-geral da República Augusto Aras, nas investigações que lhe são afetas, especialmente quando recaem sobre condutas funcionais do presidente Jair Bolsonaro?

De plano, é de se ressaltar que o Juiz das Garantias, instituído pela Lei nº 13.964 de 2019, ampliou, e por modo largo, a conduta do magistrado no âmbito da investigação criminal, expressamente marcando-o como “responsável pelo controle da legalidade da investigação” e, portanto, autorizando-o a:

X – requisitar documentos, laudos e informações do delegado de polícia sobre o andamento da investigação;

XI – decidir sobre os requerimentos de:

a)    – interceptação telefônica, do fluxo de comunicações em sistemas de informática e de outras formas de comunicação;

b)     – afastamento dos sigilos fiscal, bancário, de dados e telefônico;

c)     – busca e apreensão domiciliar;

d)     – acesso a informações sigilosas; (incisos presentes na nova redação do artigo 3º, do Código de Processo Penal).

Por outra linha de argumentação, é fato notório, disseminado pela mídia brasileira e também, exaustivamente, presente nas redes de comunicação social que o procurador-geral da República, Augusto Aras, por si, ou pela vice-procuradora-geral da República de sua eleição, Lindora Araújo, atuando por designação sua, ambos vêm, sistematicamente, pronunciando-se pelo arquivamento de qualquer pretensão investigatória no quadro da pergunta que acima me formulei, pronunciamentos vazados em plano de generalidade, que se revela na utilização de frases abstratas, totalmente divorciadas de mínima fundamentação sobre os fatos que lhes são apresentados.

Presente esse quadro, estampado na cobertura jornalística e no conhecimento público, avanço na minha linha de argumentação e considero juridicamente possível, invocando a aplicação analógica, de plena incidência nas questões atinentes ao processo penal – artigo 3º, caput, do CPP -, do quanto dispõe o artigo 28 do mesmo Código de Processo Penal, que estabelece juízo de controle mitigado do magistrado sobre o pronunciamento conclusivo de membro do Ministério Público pelo arquivamento de investigação criminal aos casos de competência originária do Supremo Tribunal Federal.

Com efeito, em situações que tais – o Procurador-Geral da República concluindo pelo arquivamento de investigação criminal originária no Supremo Tribunal Federal – a composição plenária do Supremo Tribunal Federal, discordando desse pedido, encaminha o procedimento investigatório para exame e decisão final do Conselho Superior do Ministério Público Federal, órgão colegiado máximo do Ministério Público Federal, até porque esse Conselho Superior detém a atribuição de processar e julgar condutas funcionais do próprio Procurador-Geral da República, a teor cristalino do artigo 57, inciso X, da Lei Complementar nº 75/93:

Artigo 57: Compete ao Conselho Superior do Ministério Público Federal:

X – designar Subprocurador-Geral da República para conhecer de inquérito, peças de informação ou representação sobre crime comum atribuído ao Procurador-Geral da República e, sendo o caso, promover a ação penal.

Tendo o órgão máximo do Ministério Público Federal a decisão final sobre o destino da investigação criminal nos casos de competência originária do Supremo Tribunal Federal preservado está, integralmente, o princípio acusatório.

  

 

 

 

terça-feira, 9 de agosto de 2022

"NUNCA PERCA DE VISTA O SEU PONTO DE PARTIDA"

 


 

Essas são palavras de Santa Clara, escritas na 2ª Carta que enviou para Santa Inês de Praga, ambas filhas da nobreza europeia, ambas rompendo com esse estado de vida para, em clausura, dedicarem-se ao viver na extrema pobreza.

Esclareçamos, de pronto, a expressão de que me utilizei acima: “em clausura”.

Não quer significar, de forma alguma, fuga do mundo, ou qualquer tipo de solidão alienada. Muito pelo contrário, a consciente opção pela vida “em clausura” significa envolver-se com o mundo, todavia em perspectiva de não se deixar atordoar pelas coisas do mundo, então a elas sucumbindo. Antes, é oferecer-se, integral e comunitariamente, a Jesus Cristo para ser “exemplo e espelho” de pobreza, simplicidade e alegria para o mundo, posto que, como ainda escreve Santa Clara a Santa Inês de Praga na 3ª Carta, a propósito do mundo em que ambas viveram, no passado:

“É nisso que se enganam alguns reis e rainhas do mundo, cuja soberba, embora possa chegar até o céu e tocar, com a cabeça, nas nuvens, perder-se-á, no fim, como um monte de esterco”. (Fontes Franciscanas – pg. 1364).

Eis palavras concretas, firmes, objetivas de quem, bem conhecendo o mundo, propõe caminho diverso a tantas e tantos quantos circunscrevem-se ao mundo, ao mundano material, como a única razão de existir.

Por isso, a plena coerência da expressão: “nunca perca de vista seu ponto de partida”.

Sim, porque nunca perder de vista seu ponto de partida significa, antes de tudo, definir-se, sem rodeios, por determinado objetivo.

Recordo-me de meu ponto de partida profissional.

Lá pelo meio dos estudos na Faculdade de Direito, da Universidade de Brasília, três vias tinha diante de mim: ser membro do Ministério Público; ser juiz; ser advogado.

Juiz não desejei ser porque não sou imparcial e a imparcialidade é a pedra de toque da magistratura para bem e corretamente julgar os pleitos que lhe são submetidos.

Advogar em nome de alguém também nisso não me reconheci porque sou motivado à visão do comunitário, do coletivo, do social sob o enfoque da contínua promoção do bem comum nos valores de afirmação à perene construção da cidadania participativa.

Então, ser Ministério Público inspirou-me como ponto de partida que, justo por constituir-se em ponto de partida, necessariamente alcança ponto de chegada e, assim, a vida é itinerário valioso porque se revela, verdadeiramente, em missão coerente.

Hoje, pululam arrivistas calcados na mentira, na desfaçatez, na grosseria, incapazes de dar vida às expressões tão consentâneas à sociedade humanista que, na pluralidade, encontra a unidade, as expressões: “por favor”; “com licença”; agradecido”.

Tempos obscuros, pesados; de olhares vidrados, friamente inexpressivos; de palavreado chulo, expressões agressivas; de atitudes intempestivas, comportamentos mesquinhos.

Eles, os arrivistas, assim o são porque não têm ponto de partida.

Ter ponto de partida é saber sonhar, com esperança, porque o sonho de esperança é a possibilidade real do fazer acontecer o que é bom. Assim, o sonho é o caminho para a transcendência, para o encontro com o Deus-Amor ou, como afirma Santa Clara na 3ª Carta a Inês de Praga:

“...põe tua mente no espelho da eternidade, a tua alma no esplendor da glória e teu coração na figura da substância divina e transforma-te toda pela contemplação na imagem da própria divindade, a fim de sentires, tu mesma, o que sentem os amigos, degustando a doçura escondida que o próprio Deus reservou, desde o início, para os que Ele ama. E tendo preterido totalmente todos aqueles que, neste mundo falaz e perturbador, enganam seus cegos servidores, ama inteiramente só Aquele que se entregou todo por teu amor, cuja beleza o sol e a lua admiram e cuja recompensa não tem fim nem em valor nem em tamanho. (Fontes Franciscanas – pg. 1363/1364).

quinta-feira, 21 de julho de 2022

A INDEPENDÊNCIA FUNCIONAL: GARANTIA CONSTITUCIONAL DA MISSÃO DEFINIDA AO MINISTÉRIO PÚBLICO

 


 

                                                                           

 

A “Constituição Coragem”, assim o Presidente da Assembléia Nacional Constituinte, Ulysses Guimarães, definiu a Carta Constitucional de 1988.

Sim, “Constituição Coragem” porque disposta a sepultar o ciclo ditatorial que massacrou o Brasil. Ciclo, como todo ciclo ditatorial, caracterizado pelo constante desprezo da pessoa humana subjugada, humilhada, torturada, morta.

Carta Constitucional destinada a promover “sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias”, nos termos próprios de seu Preâmbulo.

Comprometida, portanto, com a diuturna construção da Sociedade brasileira calcada nos valores absolutos, por isso que inegociáveis e inextinguíveis, acima relevados.

No particular aspecto das “funções essenciais à justiça”, por coerência com os propósitos avivados, definiu o Ministério Público.

Eis a definição:

“Artigo 127 – O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”.

O Ministério Público não é órgão absorvido e dependente de um todo.

Ele é o próprio todo institucional. Vale dizer: tem definida missão constitucional, posta em termos perenes. Portanto, não se sujeita às vicissitudes temporais. Permanece sempre.

E por que assim?

Porque sua missão constitucional, que é a sua própria razão de existir, radica na defesa intransigente:

- da ordem jurídica;

- do regime democrático; e

- dos interesses sociais e individuais indisponíveis.

A democracia, assentada na observância irrestrita da ordem jurídica, é o regime político que estimula e preserva o convívio diuturno “dos interesses sociais e individuais indisponíveis”.

A democracia acontece e é vivida na efetiva participação cidadã pessoal e comunitária, manifestação real “dos interesses sociais e individuais indisponíveis”.

A democracia, por tal modo, impede que o aparato governamental do Estado se torne o provedor absoluto “dos interesses sociais e individuais indisponíveis”.

Cunhei a expressão: “o Ministério Público é a voz da Sociedade brasileira diante do Poder Judiciário”.

Portanto, não se confundem os interesses governamentais com “os interesses sociais e individuais indisponíveis”.

Totalmente equivocada a ideia segundo a qual o que é bom para o Estado-Administração é necessariamente bom para a Sociedade.

A instituição Ministério Público faz-se presente para garantir e propiciar a autonomia da cidadania ante a estrutura estatal de governo.

Coerente com esse tratamento constitucional conferido ao Ministério Público, a Carta Magna preceitua em seu §1º, do artigo 127:

§1º - “São princípios institucionais do Ministério Público a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional”.

A unidade e a indivisibilidade marcam o componente formal da instituição Ministério Público, ou seja, não há hierarquia, não há fraccionamentos no desempenho funcional dos membros do Ministério Público. Costuma-se dizer que quando o membro do Ministério Público se pronuncia em caso que lhe está afeto, assim o faz “presentando” o Ministério Público, e não o representando. É a própria voz da instituição e não a voz que faz as vezes dela.

A independência funcional marca o componente substancial do Ministério Público.

Com efeito, despido de independência funcional, impossível para o membro do Ministério Público pautar-se em seu agir de modo a corresponder à missão constitucional que lhe é conferida.

A democracia expressa-se na transparência na condução dos assuntos de ordem pública.

A transparência revela-se no por às claras o que se há de fazer e o que se fez à consecução do bem comum.

O por às claras é imprescindível a que se fiscalize, com plena autonomia e responsabilidade, os atos e condutas de quem quer que exerça cargo, ou função pública.

Como afirmar-se a independência funcional se aparato de conceitos normativos genéricos, amplos, abstratos, imprecisos são colocados como medidores do desempenho funcional dos membros do Ministério Público?

Na democracia todos os atos e comportamentos funcionais são sindicáveis, mas sempre à luz de prévia tipificação, marcada por descrição de condutas concretas, objetivas, precisas, claras.

Por outra perspectiva, a independência funcional conduz-nos ao processo de escolha da chefia do Ministério Público da União: o Procurador-Geral da República.

Nos termos atuais, o texto constitucional é acanhado, comprometendo, seriamente, a independência funcional.

Assim o § 1º, do artigo 128, da Constituição Federal:

§ 1º - “O Ministério Público da União tem por chefe o Procurador-Geral da República, nomeado pelo Presidente da República dentre integrantes da carreira, maiores de trinta e cinco anos, após aprovação de seu nome pela maioria absoluta dos membros do Senado Federal, para mandato de dois anos, permitida a recondução”.

Como se vê, o Presidente da República tem ampla influência na escolha sobre quem há de ser a/o Procuradora/r-Geral da República. Pinça, a seu bel prazer, alguém integrante da carreira do Ministério Público da União; tem o juízo exclusivo e autocrático sobre reconduzir quem, por ele escolhido, quantas vezes ele, Presidente da República, o desejar; e, ainda, pode oferecer ao Procurador-Geral da República cargo outro a seu completo alvedrio.

Importa mudar esse quadro.

Mudar para que se afirme e garanta a independência funcional, pedra de toque, como aqui demonstrado, fundamental à afirmação da razão de ser do Ministério Público.

Proponho nova redação para o §1º, do artigo 128, posta nesses termos:

§1º - “O Ministério Público da União tem por chefe o Procurador-Geral da República, nomeado pelo Presidente da República dentre integrantes da carreira do Ministério Público federal, maiores de trinta e cinco anos, constantes de lista tríplice elaborada pelos membros do Ministério Público federal, após a aprovação de seu nome pela maioria absoluta do Senado Federal, para mandato de três anos, vedada a recondução e vedado o exercício de qualquer outro cargo público após findo o mandato, ou durante o seu curso”.

As alterações, que proponho, estão:

- na adoção da lista tríplice;

- na sua elaboração a cargo dos membros do Ministério Público federal;

- no mandato trienal;

- na vedação da recondução; e

- no impedimento ao exercício de qualquer ouro cargo público durante o desempenho do mandato trienal, ou após a conclusão do mandato.

A formação da lista tríplice propicia o amplo debate não só interna corporis – o que é fundamental no sentido de que os postulantes, concretamente, mostrem-se às claras para a classe – como também suas posições se abrem ao conhecimento público, via cobertura midiática do processo eletivo.

Não se exalta o corporativismo.

Promove-se o confronto de ideias; instaura-se o pleno debate.

Portanto, o nome da/o Procuradora/r-Geral da República não é mais pinçado pelo reduzido círculo do gabinete palaciano. O Presidente da República está adstrito à escolha de um, dentre os três nomes que lhe são apresentados pelos membros do Ministério Público federal.

O fato da elaboração da lista tríplice ser cometida aos membros do Ministério Público federal não trai qualquer exclusivismo.

Percorre-se linha de pertinência temática.

Com efeito, o Ministério Público da União contempla o Ministério Público federal, no âmbito de suas atribuições funcionais, em espaço de não especificidade.

Os demais ramos são reconhecidos por especificidade própria e restrita. Assim, o Ministério Público do trabalho afeto está às questões de natureza trabalhista; o Ministério Público militar às controvérsias de índole castrense e o Ministério Púbico do Distrito Federal tem o âmbito de sua atuação circunscrito aos assuntos atinentes ao Distrito Federal.

A vedação, tanto à recondução, quanto ao impedimento de exercer outro cargo público, durante ou após o exercício do mandato trienal, é vital para a independência funcional.

Por esse modo, evita-se, certamente, o barganhar no desempenho desse cargo de tão elevada responsabilidade social.

Nos dias de hoje, é deplorável a conduta funcional do Procurador-Geral da República, Augusto Aras, notoriamente marcado por quadro, ampla e fundamentadamente divulgado, nos mais variados segmentos do convívio social, notadamente no âmbito da imprensa escrita e falada, de completa omissão, quando não de retardo, no desempenhar suas atribuições constitucionais, mormente quando em jogo está a pessoa do presidente da República na condução dos assuntos públicos, que lhe digam respeito.

É tempo propício à correção dessa situação.

Porque se proceda à imediata modificação do texto constitucional, que trata da escolha do Procurador-Geral da República, nos termos aqui propostos, e justificados.