terça-feira, 19 de dezembro de 2017

O TEMPO

                                                

Começar por onde, este artigo?
Tantos acontecimentos pessoais, familiares, comunitários, institucionais.
A necessidade de ter o tempo, que inicia e o tempo, que termina: a necessidade do calendário. É mesmo necessário o calendário?
Pronto: começo motivado por essa pergunta.
Sim, é necessário o calendário porque necessário é o tempo.
O tempo, não o tenho como marcha inexorável do alvorecer para o decair.
Também não o tenho, o tempo, como o percurso da fatalidade, quando o existir é o mero suceder do que já está determinado.
O tempo, no acontecer dos dias, é a possibilidade real do ser além do que se é, portanto o tempo não nos imobiliza, mas impele-nos à contínua descoberta. O tempo, então, convida-nos a sonhar porque o sonho é a oportunidade concreta do existir.
Sonhar é realizar.
O tempo nas mutações corpóreas ele, o tempo, é o caminho do aprendizado.
Aprender o quê, ou para que, perguntará o cético, que é aquele que assim o é por desdenhar do tempo, quando os limites mentais e físicos afloram, e definhamos?
Ora, justamente porque há o tempo, mulheres e homens movimentam-se em ciclos, e os ciclos da existência humana são plenos de sentido não só para o ser em si, como para o ser com os outros, desde que, e justo porque são ciclos concatenados, tudo se ponha em abrir-se ao aprendizado que a etapa anterior sempre propicia à etapa seguinte.
Aprender, não importam as vicissitudes que experimentamos porque, se aprendemos, elas não nos dominarão, é compreender o tempo.
O Deus-Amor, porque nos ama, e não há medida do amor divino por nós, porque nos deu a conhecer tudo sobre Ele próprio (Jo. 15, 15), percorreu, Ele também, o tempo.
O dia 25 de dezembro, já tão próximo, é a linda celebração do Eterno que, ao nascer, se inseriu no tempo, como que a nos dizer que o tempo, por mais diminuto que seja, já completa o existir porque o tempo é a impossibilidade do nada.

                      Proveitoso Tempo de Natal a todas e a todos.


                             

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

A CULTURA É A EXPRESSÃO DO AUTÊNTICO



O inciso IV, do artigo 5º, da Constituição Federal é taxativo:
“É inviolável a liberdade de consciência e de culto, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”.
Cristalino está que razão – consciência – e fé –crença – irmanam-se na integralidade da pessoa e a expressão de atos e condutas a tanto positivar não admite restrição de qualquer ordem, justo porque se constituem, repito, em expressão da própria pessoa.
Consequência natural é a presença, ainda no analisado texto constitucional, da garantia às celebrações do culto em si e nos locais a que se destinam.
Em seção destinada à cultura, o preceito constitucional assim está posto no artigo 215:
“O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais”.
Nos dois parágrafos, que se seguem, e no artigo 216, fica nítido que “as manifestações culturais” são definidas como tudo o que se insere no amplo âmbito “das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras e de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional” (§ 1º - artigo 215), inclusive no que diz respeito a “datas comemorativas de alta significação para os diferentes segmentos étnicos nacionais” (§ 2º - do artigo 215) porque o patrimônio cultural brasileiro está na “referência à identidade, à ação, à memória de diferentes grupos formadores da sociedade brasileira” (artigo 216).
Fixadas essas linhas mestras de abordagem, até porque se definem em sede constitucional, importa, agora em passo seguinte, que nos detenhamos, topicamente, no caso, posto que há de se examinar fato a fato dada a impossibilidade de se assumir postura de generalidade que, sem dúvida, estamparia viés fundamentalista no que se examina e, então na avaliação de cada caso, ter-se a justa resposta.
O fato é: homem nu, segurando a imagem de Nossa Senhora Aparecida, encobrindo sua genitália, põe-se a ralar a imagem até que ela se desfigure, por completo.
Óbvio está que não existe qualquer manifestação cultural nesse fato.
Bem pelo contrário, há claro vilipêndio público a objeto de culto religioso, de cunho católico, que se identifica no “ralar” a imagem até que desapareça e completa subversão sobre o significado cultural de Nossa Senhora Aparecida, que radica na defesa e proteção da escravizada comunidade negra e dos pobres pescadores ribeirinhos, na época do Brasil-Colônia, subjugados pelos ricos fazendeiros e a Coroa portuguesa. Detalhe verdadeiramente grotesco: o homem, que segura a imagem, é negro.
Tem-se diante o desrespeito eloquente à proteção das manifestações culturais alusivas à cultura afro-brasileira.
Outro fato de igual reprovação: material, totalmente reconhecido como hóstias, é identificado com órgãos excretores e reprodutores da mulher e do homem em exposição pública patrocinada pelo banco Santander.
Nisso tudo – e sem a necessidade de comentários outros – o que não se tem, indubitavelmente, é “manifestação cultural”.
Tem-se, isso sim, mera prática apelativa, sensacionalista, típica dos aproveitadores mercantis, de ocasião.
A cultura é expressão do autêntico.
Cultura, insisto, não se concilia com manipulações.
  


segunda-feira, 9 de outubro de 2017

FASCISTAS E DEMOCRATAS USAM A MESMA TOGA”

São palavras do Desembargador do Tribunal de Justiça de Santa Catarina e Professor da Universidade Federal no mesmo Estado, magistrado Lédio Rosa de Andrade, pronunciadas em discurso em homenagem a seu amigo-irmão Luis Carlos Cancellier, reitor da Universidade Federal de Santa Catarina, que terminara com sua própria vida, no dia 2, próximo passado.
Estamos em tempos obscuros.
Obscuros porque as ditas elites, que tem a responsabilidade maior na condução de todos os assuntos pertinentes ao bem comum, na especificidade de como se apresentam – seja no governar, no legislar e no julgar – divorciaram-se, por completo, de tão valorosa missão.
O que se assiste é a prática reiterada e desavergonhada do corporativismo a engendrar “pactos”, “soluções de ocasião”, “arranjos”, que espelham a covardia no assumir posições concretas, objetivas, comprometidas com a verdadeira adoção de medidas para, paulatinamente, construírem a sociedade fraterna, porque justa.
Não, nada disso se objetiva.
Familiariza-se e eterniza-se a representação popular; o jogo de palavras e gestual estudado formatam o quadro, assim manipulado, para o exercício da administração pública; o desequilíbrio verborrágico incessante atropela, letalmente, a serenidade e a imparcialidade de todos quantos decidem.
Torno ao Professor e Desembargador Lédio Rosa de Andrade a dizer:
“É claro que um Estado Democrático de Direito precisa de imprensa livre. É claro que um Estado Democrático de Direito precisa de independência do Judiciário. Que o Judiciário e os juízes julguem, livremente, sem pressão. Só que, também, é claro que essas instituições absolutamente importantes para a democracia a cada dia, a cada momento, são deturpadas. Em nome da liberdade de imprensa, se exerce a liberdade da empresa privada para impor desejos privados à coletividade. Em nome da liberdade de julgar, neofascistas humilham, destroem, matam”. (Jornal do Brasil: publicação eletrônica do dia 07/10 às 13h.24).
E, com pleno acerto encerrou o Professor e Desembargador Lédio Rosa de Andrade:
“Bertolt Brecht já nos disse. Já estão levando não só os vizinhos, já estão levando nossos amigos próximos e vão nos levar. A vida é isso, companheiros. É luta permanente. E a democracia não permite descanso. Não permite descanso. Eu, hoje, como professor da UFSC sou uma pessoa que tem orgulho e alegria. Como desembargador, tenho vergonha. Porcos e homens se confundem. Fascistas e democratas usam as mesmas togas”. (publicação citada).

Trago, aqui e agora, porque tão oportunas e sábias, as palavras do Papa Francisco, na mensagem quaresmal para o corrente ano, motivadas pela cena evangélica do pobre Lázaro e o homem rico:
“O apóstolo Paulo diz que a raiz de todos os males é a ganância do dinheiro (1 Tm 6, 10). Esta é o motivo principal da corrupção e uma fonte de invejas, contendas e suspeitas. O dinheiro pode chegar a dominar-nos até ao ponto de se tornar um ídolo tirânico (cf. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, 55). Em vez de instrumento ao nosso dispor para fazer o bem e exercer a solidariedade com os outros, o dinheiro pode-nos subjugar, a nós e ao mundo inteiro, numa lógica egoísta que não deixa espaço ao amor e dificulta a paz. Depois a parábola mostra-nos que a ganância do rico fá-lo vaidoso. A sua personalidade vive de aparências, fazendo ver aos outros aquilo que se pode permitir. Mas a aparência serve de máscara para o seu vazio interior. A sua vida está prisioneira da exterioridade, da dimensão mais superficial e efêmera da existência (cf. ibid., 62).
O degrau mais baixo desta deterioração moral é a soberba. O homem veste-se como se fosse um rei, simula a posição dum deus, esquecendo-se que é um simples mortal. Para o homem corrompido pelo amor das riquezas, nada mais existe além do próprio eu e, por isso, as pessoas que o rodeiam não caem sob a alçada do seu olhar. Assim o fruto do apego ao dinheiro é uma espécie de cegueira: o rico não vê o pobre esfomeado, chagado e prostrado na sua humilhação”. (mensagem quaresmal do Papa Francisco para o ano de 2017).
Comecei este escrito, dizendo: “Estamos em tempos obscuros”.
Sim, estamos.
Aos 16 anos de idade, e esta semana chego aos 71, sonhando e me empenhando com tantas e tantos mais por nosso Brasil, brasileiro; por nosso Brasil honesto, justo, fraterno e vi-me, então aos 18 anos de idade, derrotado, destroçado, sofrido, mas permaneci fiel ao sonho, que sonhei. Não o abandonei, e o dia amanheceu porque nuvens obscuras nunca impedirão que o sol sempre nasça, e ilumine.
Com muita alegria, venho de ler palavras do Papa Francisco, ditas há pouco, na Audiência Geral da quarta-feira, dia 20 de setembro, que me fazem tão bem, porque me entusiasmam a não desistir. Diz Francisco:
“Cultiva ideais. Vive algo que supera o homem. E mesmo se um dia estes ideais apresentarem uma conta alta a pagar nunca deixe de os conservar no coração. A fé obtém tudo. Se erras, levanta-te: nada é mais humano do que cometer erros. E aqueles mesmos erros não se devem tornar para ti uma prisão. Não fiques preso nos teus erros. O Filho de Deus veio não para os sadios, mas para os doentes: portanto, veio também para ti. E se errares ainda no futuro, não temas, levanta-te! Sabes porquê? Porque Deus é teu amigo. Se a amargura te atinge, crê firmemente em todas as pessoas que ainda trabalham pelo bem: na sua humildade está a semente de um mundo novo. Frequenta pessoas que conservam o coração como o de uma criança. Aprende da maravilha, cultiva a admiração. Vive, ama, sonha, crê. E, com a graça de Deus, nunca te desesperes”. (mensagem quaresmal mencionada).

                                          Paz e Bem.




   

domingo, 10 de setembro de 2017

"IR AO ESSENCIAL; RENOVAR-SE; ENVOLVER-SE".



Um homem, vestes brancas, semblante decidido e alegre, percorre o mundo. Sua mensagem, sincera e honesta, porque é expressão eloquente do seu agir, é de paz e solidariedade, principalmente com os excluídos, com os postos à margem, desejando ardentemente a construção da fraternidade universal.
Na Colômbia, ontem, sábado 9 de setembro, na cidade de Medellín, marcada por ter sediado cartel de tráfico de drogas, diante de cerca de um milhão de pessoas, esse homem, o Papa Francisco ensina-nos:
“A liberdade de Jesus contrasta com a falta de liberdade dos doutores da lei daquele tempo, que estavam paralisados por uma interpretação e prática rigoristas da lei”. (trecho da homilia do Papa Francisco na celebração eucarística em Medellín).
No Brasil, ontem, sábado 9 de setembro, brasileiras e brasileiros mergulhavam em sentimentos embaralhados de decepção, revolta, pessimismo em consequência das atitudes de nossos doutores da lei, espalhados em cargos de elite, e de atitudes de empresários, de visibilidade maior, que se consorciam e se consorciaram, anos a fio, em reiteradas práticas de corruptores e de corruptos.
Não é bom, não é útil, que nos deixemos dominar por tais sentimentos, ainda que compreensíveis.
Como reagir, então?
Retornemos à homilia do Papa Francisco.
Ele nos propõe três (3) atitudes.
“Ir ao essencial” que, para ele, está em “caminhar em profundidade rumo ao que conta e tem valor para a vida”. E prossegue: “Jesus ensina que a relação com Deus não pode ser uma fria aderência a normas e leis, nem o cumprimento de certos atos exteriores, que não conduzem a uma mudança de vida”. (trecho da mencionada homilia).
“Renovar-se” que acontece quando abandonamos nossas “comodidades e amarras”, as famosas “zonas de conforto” e nos “pomos em saída”, sem medo, e também sem nos jactarmos, mas no espaço de nossa presença familiar, laboral, de vizinhança, dos círculos que frequentamos, nos conduzimos, concreta e objetivamente, em comportamentos de cidadania ativa, que se traduzem na participação consciente e vinculada à afirmação cotidiana e incessante dos valores da construção do bem comum contra a maré da tecnocracia e do finalismo econômico-financeiro porque a técnica e a economia hão de ser sempre consideradas como instrumentos à realização do bem comum, jamais como objetivo primordial de exaltação de uns poucos em detrimento de tantos desamparados e degradados em sua dignidade.
A dignidade humana não se concilia com a segregação.
A dignidade humana deita raízes, e assim se manifesta, na possibilidade de ser e de ter, na dimensão da singularidade de cada um, pela oferta do que é próprio ao próximo, jamais pelo apossamento exclusivista e excludente.
“Envolver-se” é o terceiro passo que nos propõe o Papa Francisco.
Aqui, porque tão precisas, e encerrando este artigo, suas próprias palavras, na mencionada homilia:
“A terceira palavra: envolver-se. Envolver-se, ainda que para alguns isso pareça sujar-se, manchar-se. Como David e seus homens que entraram no templo porque tinham fome e os discípulos de Jesus entraram na seara e comeram as espigas, também hoje nos é pedido que cresçamos em ousadia, numa coragem evangélica que brota de saber que são muitos os que têm fome, fome de Deus, fome de dignidade, porque dela foram despojados. E, como cristãos, ajudá-los a saciar-se de Deus; não lhes dificultar nem proibir esse encontro. Não podemos ser cristãos que levantam continuamente a bandeira de “Passagem Proibida”, nem considerar que esta parcela é minha, apoderando-me de algo que absolutamente não é meu”.

                                               Paz e Bem.


terça-feira, 15 de agosto de 2017

CAPÍTULO DAS ESTEIRAS

                             

“... o que ouvimos, o que vimos com os nossos olhos, o que contemplamos...”, valho-me dessas expressões de São João evangelista, que iniciam sua Primeira Carta, para dizer dos dias na cidade de Aparecida para o Capítulo Nacional das Esteiras – 2017, da Ordem Franciscana, no Brasil.
Mulheres e homens de várias gerações irmanaram-se
E quando, verdadeiramente, nos irmanamos somos dóceis e, assim, pacientes; somos alegres e, assim, “esperamos contra toda a esperança”; somos construtores da paz e do bem e, assim, não nos intimidamos em tempos de desordem e fragmentação.
Preferimos, Ângela e eu, as 38 horas de ônibus – o percurso Brasília-Aparecida-Brasília- e o singelo hotel, com o sintomático nome de Libertador, em cenário que, para nós, equivaleu ao caminhar, carregando e repousar, estendendo, as esteiras.
Ouvimos as vozes femininas e masculinas a dizer de si, no sair de si, e realizar o encontro fraterno, que testemunha o envolvimento consciente e firme para marcar a adesão contínua ao convite de Deus para o acolher e cuidar de nós mesmos; de nós com o nosso outro eu, ou seja, nossas irmãs e nossos irmãos, todas e todos, sem distinções; de nossa casa, portanto, comum na reverência aos elementos que a compõem: a terra, que é sempre caminho; o ar, que é sempre impulso; a água, que é sempre mergulho e o fogo, que é sempre superação.
Ouvimos vozes femininas e masculinas em cantos de celebrar, de agradecer, de conduzir. Aqui, na proposta a que nos conduzamos no, e para, o mundo na exatidão das palavras de refrão, cantado com tanto entusiasmo:
“Vamos todos voltar a Assis
Reviver o que Francisco viveu
Para então espalharmos pelo mundo
Paz e Bem e a Misericórdia de Deus”.
Sim, num mundo que nos centra no aqui e agora; na absolutização do momento presente; no circunscrever-se ao que se pode ter e ganhar, a qualquer preço; num mundo que não admite volta, devemos voltar.
Voltar e ver e voltar a ver que é o que acontece quando o passado se atualiza no presente, vale dizer, quando tornamos à nossa “fonte de água viva” que, jamais secando, é guia permanente nessa nossa travessia.
Jesus, transeunte, é a Palavra que não passa.
Francisco, transeunte, é a Ação que dinamiza.
Clara, transeunte, é a Oração que sustenta.
Não nos é dado esmorecer; não nos é dado desistir.
O cansaço há de gerar a pausa, para recomeçar; não se faz em ponto final.
Esse é o sentido das palavras de Francisco, plenas de entusiasmo, ainda que proferidas no ocaso de sua vida, como registradas por Tomás de Celano.
“Vamos começar a servir a Deus, meus irmãos porque até agora fizemos pouco, ou nada”. (Tomás de Celano – Primeira Vida de São Francisco – Fontes Franciscanas – pg. 256).
Com efeito, a perfeita adesão a Deus, por Jesus Cristo, é o caminhar infinito porque só caminhando nos encontramos conosco; encontramos a irmã e o irmão; encontramos nossa casa comum; e, então, encontramos o próprio Deus.
“O que ouvimos, o que vimos, o que contemplamos” em Aparecida é a certeza de que
“o acontecer humano não é circuito fechado. Percorrendo-o, movimentamos; movimentando, existimos em possibilidade infinita.” (Claudio Fonteles – Três Momentos da Doutrina Social da Igreja – p15).
Encerro com o que está posto no Compêndio da Doutrina Social da Igreja – nº 47 – pg. 39:
“Por isso, alienado é o homem que recusa transcender-se a si próprio e viver a experiência do dom de si e da formação de uma autêntica comunidade humana, orientada para o seu destino último, que é Deus. Alienada é a sociedade que, nas suas formas de organização social, de produção e de consumo, torna mais difícil a realização deste dom e a constituição dessa solidariedade inter-humana”.

                                    Paz e Bem.



                              

terça-feira, 30 de maio de 2017

OLHAR DE CONJUNTO

                              

“A lucidez supõe a resistência às tentações do ódio e ao culto da fatalidade”.
Essa frase, escrita por Albert Camus, em Manifesto a abordar “os quatro mandamentos do jornalismo livre”, quando foi escrita, em 25 de novembro de 1939, não pode ser publicada no jornal “Le Soir Républicain”. O cutelo da censura oficial silenciou-a.
Contudo, como se vê, Albert Camus não se desestruturou; não partiu para comportamentos extremados, não se tornou um vândalo destruidor; não incitou à violência.
Muito pelo contrário. Ensinou-nos a perseverar no equilíbrio, sem abdicar de nossas convicções e ações, “resistindo às tentações do ódio”, que nos afastaria do permanecer no empenho por nossos ideais, por nossa mística, e, então, ocupados seríamos, exclusivamente, pelo confronto em si: guerrear e destruir.
Ensinou-nos, mais: Ensinou-nos que a lucidez, em nós, afasta “o culto da fatalidade”, que gera o imobilismo, a descrença, a passividade alienada.
A lucidez, então, nos impele a perseverar porque, perseverando, aprendemos.
Eis porque, linhas adiante em seu Manifesto, diz:
“Não publica nada que possa excitar o ódio ou provocar o desespero. Tudo isso está em seu poder. Face à maré alta da animalidade, é necessário opor algumas recusas... Em consequência, um jornal independente dá origem de suas informações, ajuda o público a avaliá-las, repudia o entupimento do crânio, suprime as invectivas, disfarça, por comentários, a uniformização das informações e, em resumo, serve à verdade na medida humana de suas forças. Essa medida, por relativa que seja, permite-lhe ao menos recusar o que nenhuma força neste mundo poderia fazê-lo aceitar: servir à mentira”.
São João Paulo II, igualmente avaliando o papel da imprensa, adverte-nos sobre o entrave à verdadeira razão de ser da mulher e do homem, em que esse tipo de comunicação social converte-se quando apartado de sua nobre missão de informar para formar. Diz São João Paulo II em sua Carta Encíclica Centesimus Annus:
“O homem que se preocupa só ou prevalentemente do ter e do prazer, incapaz já de dominar os seus instintos e paixões e de subordiná-los pela obediência à verdade, não pode ser livre: a obediência à verdade sobre Deus e o homem é a primeira condição da liberdade, permitindo-lhe ordenar as próprias necessidades, os próprios desejos e as modalidades de sua satisfação, segundo uma justa hierarquia, de modo que a posse das coisas seja para ele um meio de crescimento. Um obstáculo a tal crescimento pode vir da manipulação realizada por alguns meios de comunicação social, que impõem, pela força de uma bem orquestrada insistência, modos e movimentos de opinião, sem ser possível submeter a um exame crítico as premissas sobre as quais se fundamentam”. (Carta Encíclica Centesimus Annus nº 41 – pg. 78).
Também o Papa Francisco, apropriadamente em Mensagem para o 49º Dia Mundial das Comunicações Sociais, apresentada aos 17 de maio de 2015, é claro:
“Assim o desafio que hoje se nos apresenta é aprender de novo a narrar, não nos limitando a produzir e consumir informação, embora esta seja a direção para a qual nos impelem os potentes e sofisticados meios de comunicação contemporânea. A informação é importante, mas não é suficiente, porque muitas vezes simplifica, contrapõe as diferenças e visões diversas, solicitando a tomar partido por uma ou pela outra, em vez de fornecer um olhar de conjunto.” (Mensagem citada – pg. 4).
Eis a expressão chave: “o olhar de conjunto”.
Sim, a concretude da lucidez pessoal e a sabedoria da democracia, que é o reflexo coletivo da lucidez, radicam no “olhar de conjunto” porque “o olhar de conjunto” abre-nos à escuta, ao diálogo, à unidade na diversidade para a construção diuturna do bem, que assim é comum, ou seja, partilhado por cada um, porque antes partilhado por todos. Jamais porque da sobra do que é meu os outros receberão, se é que receberão.
Hoje, no Brasil, estamos em momentos de questionamentos.
Questionamentos são salutares porque nos propiciam exercitar a lucidez.
Colhamos, pois, esses momentos para que os façamos frutificar no estabelecimento da convivência, que zele pela promoção integral da mulher e do homem, só possível de acontecer no “olhar de conjunto”.

 


         

sábado, 15 de abril de 2017

RESSURREIÇÃO

                                         

Tenho, para mim, que nunca foi tão necessária a ressurreição.
A ressurreição não é um passe de mágica. Não advém do nada; não irrompe, abruptamente.
É condição de vida e, assim, insere-se no cotidiano de nosso existir.
A dificuldade de ressurgir acontece para nós porque hoje, mais do que nunca, estamos em sistemática programação.
Programados em celulares; programados diante de televisores e fones de ouvido; programados em relações humanas superficiais, pragmáticas e provisórias.
A programação, aliás, como toda programação, fecha-se no estabelecer esquema mental do qual não se pode escapar, esquema mental que, subvertendo valores e conceitos perenes, nos conduz à mediocridade.
Os exemplos florescem.
No quadro político ficamos a pontuar, fulanizando e partidarizando, episódios sucessivos de corrupção e, assim, perdemos de vista a análise sobre o que, realmente, importa analisar: a falência total do atual modelo político brasileiro, para a qual contribuíram e contribuem todos os partidos políticos, e as imprescindíveis e concretas medidas, que se devem adotar para a sua superação e efetivo compromisso com o modelo democrático de deliberação e gestão do que é público, no que desponta em quadro urgentíssimo o proscrever a profissionalização – fim da reeleição em todos os níveis: o mandato popular conferido a alguém por ele só pode ser exercido uma única vez, em período quinquenal – e a familiarização, ou seja, o impedimento por vinte ( 20 ) anos, a contar do fim do desempenho do mandato, de parentes, até o 3º grau, inclusive, do eleito de, concomitantemente, exercerem qualquer cargo eletivo.
No campo econômico-financeiro desponta a supremacia incontrolada do mercado, a ele até se atribuem “humores”, e nessa absolutização do econômico não contam a mulher e o homem na perspectiva de sua integralidade – pessoas dotadas à satisfação de suas necessidades espirituais, intelectuais e corpóreas -, reduzidas que são a meros indicadores da relação custo-benefício.
Que se tenha presente, esse sábio ensinamento de São João Paulo II, na Carta Encíclica Centesimus Annus”:
“Neste sentido, é correto falar de luta contra um sistema econômico, visto como método que assegura a prevalência absoluta do capital, da posse dos meios de produção e da terra, relativamente à livre subjetividade do trabalho do homem. Nesta luta contra um tal sistema, não se veja, como modelo alternativo, o sistema socialista, que, de fato, não passa de um capitalismo de estado, mas uma sociedade do trabalho livre, da empresa e da participação. Esta não se contrapõe ao livre mercado, mas requer que ele seja oportunamente controlado pelas forças sociais e estatais, de modo a garantir a satisfação das exigências fundamentais de toda a sociedade.” (leia-se Carta Encíclica Centesimus Annus nº 35 – pg. 66, grifos do original).
No mesmo diapasão, contundentes palavras do Papa Francisco, na sua Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, justamente em tópico dedicado à “Economia e distribuição de renda”:
“Enquanto não forem radicalmente solucionados os problemas dos pobres, renunciando à autonomia absoluta dos mercados e da especulação financeira e atacando as causas estruturais da desigualdade social, não se resolverão os problemas do mundo e, em definitivo, problema algum. A desigualdade é a raiz dos males sociais.
203. A desigualdade de cada pessoa humana e o bem comum são questões que deveriam estruturar toda a política econômica, mas às vezes parecem somente apêndices adicionados de fora para completar um discurso político sem perspectivas nem programas de verdadeiro desenvolvimento integral. Quantas palavras se tornaram moléstias para este sistema! Molesta que se fale de ética, molesta que se fale de solidariedade mundial, molesta que se fale de distribuição de bens, molesta que se fale de defender os postos de trabalho, molesta que se fale de dignidade dos fracos, molesta que se fale de um Deus que exige um compromisso em prol da justiça... A vocação de um empresário é uma nobre tarefa, desde que se deixe interpelar por um sentido mais amplo de vida; isto lhe permite servir verdadeiramente o bem comum com o seu esforço por multiplicar e tornar os bens deste mundo mais acessíveis a todos”. ( leia-se Evangelii Gaudium nº 208-209 – pg. 167-168, grifos nossos).
E, conclusivo:
Não podemos mais confiar nas forças cegas e na mão invisível do mercado. O crescimento equitativo exige algo mais do que o crescimento econômico, embora o pressuponha; requer decisões, programas, mecanismos e processos especificamente orientados para uma melhor distribuição de renda, para a criação de oportunidades de trabalho, para uma promoção integral dos pobres que supere o mero assistencialismo. Longe de mim propor um populismo irresponsável, mas a economia não pode mais recorrer a remédios que são um novo veneno, como quando se pretende aumentar a rentabilidade reduzindo o mercado de trabalho e criando assim novos excluídos”. (Documento citado – nº 204 – pg. 168, grifos nossos).
A morte de Jesus Cristo, ponto de fundamental meditação não só nesta Sexta-Feira santa, que me motiva a este escrito, mas que nunca deve ser apartada de nós, enquanto aqui estivermos, significa a doação gratuita e incondicional, que jamais se constitui em ponto final do viver, mas é expressão lídima da fé, que faz acontecer a contínua ressurreição do nosso eu sempre que estagnado, apodrecido, morto.
Mais uma vez, e para encerrar, colho as palavras do Papa Francisco, na já citada Evangelii Gaudium, a dizer:
“Um dos pecados que, às vezes, se nota na atividade sociopolítica é privilegiar espaços de poder em vez dos tempos dos processos. Dar prioridade ao espaço leva-nos a proceder como loucos para resolver tudo no momento presente, para tentar tomar posse de todos os espaços de poder e autoafirmação. Dar prioridade ao tempo é ocupar-se mais com o iniciar processos do que possuir espaços. O tempo ordena os espaços, ilumina-os e transforma-os em elos de uma cadeia em constante crescimento, sem retorno. Trata-se de privilegiar as ações que geram novos dinamismos na sociedade e comprometem outras pessoas e grupos que os desenvolverão até frutificar em acontecimentos históricos importantes. Sem ansiedade, mas com convicções claras e tenazes”. (Documento citado – nº 223 – pg. 178-179 – grifos do original e nossos).

                 Tenham, irmãs e irmãos, Feliz Páscoa!



    

segunda-feira, 13 de março de 2017

DE NETA E NETOS; FILHAS E FILHO; GENROS; ÂNGELA E EU



A voz não é mais infantil. Está em mutação, como todo o seu corpo. É Rafael, 12 anos, chegando aos 13, idade em que comecei a me dar por mim, adolescente, em 1960, com pai, mãe e irmã, aqui em Brasília, recém- chegados do Rio de Janeiro.
Rafael é emotivo, mas sereno.
Com 9 para 10 anos, seu irmão André. Entre o menino e o adolescente. É pensativo, introspectivo, discreto.
E, ainda, da união de Flávia, a filha, e Gilmar, o genro, Lucas e os seus 8 anos de muita energia, correria.
De Fernanda, a filha do meio, e Martin, o outro genro, nasceu Heitor, 6 anos, de boas gargalhadas, tremendo gozador, e Artur, 3 anos, ainda cauteloso, mas com a verve ensaiando o ser curtidor no gingado do andar e do batuque na mesa, no almoço dos sábados.
Claudia, a outra filha do meio, no meu coração sempre, não importando seus breves dias comigo.
Gabriel, nosso filho, ainda na dele.
Ângela, amada e companheira sempre, é amada e companheira sempre e isso é o amor: a certeza do infinito no caminhar juntos, entre lágrimas e sorrisos, da mulher e do homem.
Dessa brevíssima e muito simples descrição, desponta algo, para mim, de tão surpreendentemente belo: o “engenho e a arte” de Deus para conosco.
Não nos criou em formas; não nos fez em série de produção.
Não.
Deus criou-nos únicos e irrepetíveis.
Para cada um de nós, Deus nos fez artífices de nossa própria história de vida, que não é idêntica a de ninguém, não para que nos exaltemos, nos ambicionemos no que só em nós se identifica, mas para que o que nos identifica e é só nosso, nós não o reservemos para nós, mas o façamos frutificar em partilha com os outros que, também para nós, nos entregam o que deles é específico.
A isso, chamamos solidariedade, ou seja, dar-se continuadamente.
“Todo amor é extático”, disse alguém num belo dia. Com efeito, amar é extasiar-se, ou seja, sair de si para ir ao encontro: êxtase.
Mas “o engenho e a arte” de Deus para conosco patenteia-se, também, na família por isso, e no meu caso, dei a este artigo o título, que o apresenta: “De neta e netos; filhas e filho; genros; Ângela e eu”.
Com efeito, o Papa Paulo VI, na sua sábia Encíclica Populorum Progressio, para mim é definitivo ao analisar o significado de família. Diz:
“Porém, a família natural, monogâmica e estável, tal como o desígnio de Deus a concebeu e o cristianismo a santificou, deve continuar a ser esse lugar de encontro de várias gerações que reciprocamente se ajudam a alcançar uma sabedoria mais plena e a conciliar os direitos pessoais com as outras exigências da vida social”. ( leia-se: Populorum Progressio nº 36 – pg. 31).
Sim, a família radica nesses três fundamentos: ser natural, monogâmica e estável: natural reconhecida na união da mulher e do homem, que na sua diversidade ontológica, na sua heterogeneidade, por essa definitiva razão propicia a complementaridade, estampada na unidualidade pela qual duas vidas, permanecendo cada qual em si, abrem-se ao mais íntimo de si para ofertá-lo, continuadamente, a quem, assim, adentra em si: “Por isso, deixará o homem o pai e a mãe e se unirá à sua mulher e eles serão uma só carne” (leia-se: Gênesis 2, 24); monogâmica porque ela e ele, sem terceiros ou terceiras, na construção diuturna, sem dúvida de fadiga, de dúvida, de pranto, mas por isso mesmo que de crescimento, perseverança e harmonia, que só o amor-entrega em totalidade é capaz de possibilitar; estável porque não se é, nem se caminha, no que é transitório, precário, passageiro, alimento fugaz do relativismo mundano.
Sim, “a família é o lugar de encontro de várias gerações”. Encontram-se para que o “eu” não se absolutize no egocentrismo, mas se torne partilha, vivencie o “nós” e, então, seja expressão real, clara, viva “do conciliar os direitos pessoais com as outras exigências da vida social” (trecho da transcrição feita acima da Carta Encíclica Populorum Progressio).

Se Rafael, no hebraico a significar “Deus cura”, inicia este artigo, Maria Clara, a neta que às vésperas de completar 7 anos não se fez mais visível entre nós, culmina toda essa reflexão porque é presença constante em minha vida, certeza, assim, de que a morte não tem a palavra final porque a vida, acolhida em família, e nela vivida, ainda que por  segundos, não é lembrança, mas presença inextinguível. 

domingo, 29 de janeiro de 2017

NA PRISÃO E FOSTES VISITAR-ME

                   

Cenas desumanas. A explosão da violência. Cenas que se repetem, há anos.
Esta última frase – “cenas que se repetem há anos” – é elucidativa no demonstrar o descaso dos governos – federal e estaduais – no tratar, séria, lúcida e objetivamente a questão penitenciária.
Aliás, a resposta imediata do governo Temer bate na velha tecla: “vamos construir mais presídios”.
Equívoco manifesto.
Essa “solução” bem dá a medida de como é considerado, ou melhor, como não é considerado, quem delinquiu.
Se é bandido, delinquente, marginal, fica mesmo colocado à margem, depositado num presídio, esquecido, até mesmo porque não vota, não é cidadão. Daí o jargão policial: “é elemento”. Não é pessoa.
Certo, a mulher e o homem que cometeram crimes graves e gravíssimos devem:
- ter sua liberdade perdida, temporariamente; e
- indenizar o dano causado.
A partir dessas duas premissas podemos estabelecer que a gravidade do crime é o fator de reclusão temporária e a reclusão é incompatível com o ócio.
Sim, porque ser a reclusão temporária, e não perpétua, está na razão direta de se coadunar com a possibilidade real de que quem consumou um delito venha a mudar de vida, reintegrando-se ao corpo social. Se não, se nisso não se apresenta o princípio norteador para a questão, então que se introduza a pena de morte.
A pena de morte é, para mim, a vitória do ódio.
Acabo de assistir documentário sobre a vida de Madre Teresa de Calcutá. “Luz da minha vida” é como se chama.
A luz existe para que, necessariamente, nos vejamos. Sem que nos vejamos é impossível que nos conheçamos. Sem que nos conheçamos é impossível que nos amemos. Sem que nos amemos é impossível fazermos do próximo, não mais o próximo, mas o nosso outro eu.
Trabalhei, por cerca de 8 anos no presídio de Brasília, chamado C.I.R., ou seja, Centro de Internação e Recuperação.
Antes, sentava-me atrás de uma mesa, como membro do Conselho Penitenciário do Distrito Federal e, burocrático e preconceituosamente, opinava sobre os pedidos dos presos por livramento condicional, indulto, etc. Rejeitava, em larga maioria, todos esses pedidos, pronunciando-me por seu indeferimento.
Estava eu a poucos quilômetros da unidade prisional; longe de mim olhar “os elementos” que pediam algo com previsão legal; e, continuava eu, placidamente, aos domingos indo à missa.
Alguns meses passados e, em conflito interior, a Deus pedi força, para enfrentar o problema; coragem para afastar o medo; e discernimento para não me desnortear. Fui ver “os elementos”.
Tantas e tantas vicissitudes, enorme aprendizado.
Após quase 8 anos, assumindo outra dimensão funcional, despedi-me de meus irmãos encarcerados – não mais “elementos”, mas irmãos – e deixei escrito uma frase, até hoje, e sempre, que palpita em meu coração:
“Nunca se perde a esperança, quando há a boa palavra, no bom momento”.
Megapresídios, como tolamente se apresentam como solução, são depósitos de homens, ali jogados no abandono e no ócio.
Servidores públicos do sistema prisional inserem-se em equivocada compreensão de segurança pública, que superdimensiona o aparato da violência e do medo e não valoriza o corajoso compromisso funcional de ver e conhecer.
Obscuros personagens de um mundo, assim obscuro, jamais compreenderão, até mesmo menoscabarão e repelirão: “que a luz existe para que, necessariamente, nos vejamos”.
“... na prisão, e fostes visitar-me” é o ensinamento de Jesus, escrito por Mateus, no capítulo 25, versículo 36, de seu Evangelho.
Ora, o estar preso não é estar à margem; não é ser condenado ao ostracismo, não é receber o rótulo de “elemento”.
O preso não perde a dignidade de ser pessoa por pior que tenha sido o seu crime, ou crimes praticados.
Visitar é ver e fazer-se visto para que o itinerário do encontro seja iniciado.
A obra de Madre Teresa de Calcutá motiva-se na expressão: “tenho sede”.
Deus tem sede de nós. E a sua sede é saciada quando responde à indagação, presente na continuação do texto, retro citado de Mateus:
“Quando foi que te vimos doente, ou preso, e fomos te visitar? Então o Rei lhes responderá: Em verdade vos digo: todas as vezes que fizestes isso a um destes mais pequeninos, que são meus irmãos, foi a mim que o fizeste”. (Mt 25, 39-40).

Ou adotamos, e vivenciamos, por esse modo, o sistema prisional, ou a farsa continua.