"Cala a boca já morreu” foi a
expressão captada de tudo quanto disse a ministra Carmen Lúcia no julgamento,
que autorizou a publicação de biografias, independentemente da autorização do
biografado (primeira página do jornal O Globo do dia 11 do mês em curso).
A frase não é feliz porque à
expressão “cala a boca já morreu” segue-se “quem manda aqui sou eu”, que perfaz
o dito popular, a significar, portanto, comportamento autoritário,
comportamento esse criticado pela ministra e seus pares, sob o rótulo de
censura prévia, no condicionar-se à autorização da pessoa, retratada em livro,
a sua publicação.
Feliz também não é a chamada
“cobertura jornalística” de decisões judiciais, porque quase sempre
unilateralizada, assim inviabilizando a análise e compreensão dos temas por
todos os seus pontos de abrangência e concepções, perde-se no emocionalismo das
frases de efeito que, e como está a se ver, muito distante estão de propiciar o
conhecimento integral do que se está a discutir.
Considero, a propósito,
oportuníssimas as palavras do Papa Francisco, na sua Exortação Apostólica, “A
Alegria do Evangelho”, assim escritas:
“No mundo atual, com a velocidade das comunicações e a seleção interessada dos conteúdos
feita pelos meios de comunicação social, a mensagem que anunciamos corre mais
do que nunca o risco de aparecer mutilada e reduzida a alguns dos seus aspectos
secundários”. (leia-se: Evangelii Gaudium nº 34 – pg. 31).
Tornando ao tema das
biografias, a decisão do Supremo Tribunal Federal absolutizando o direito à
liberdade de expressão sobre o direito à privacidade também não está correta.
Direitos tão
fundamentais, quais sejam, o direito à privacidade e o direito à liberdade de
expressão, quando em confronto, a solução jurídica não se dá pela prevalência
de um sobre o outro, mas a solução jurídica aponta para a conciliação entre
ambos.
E como se dá tal
conciliação?
Simples: quem quer que
queira escrever a biografia de outrem, faça-o, mas antes de publicar o escrito,
submeta-o ao biografado que, em prazo não superior a 60 (sessenta) dias, há de
se manifestar, apresentando suas razões, pelas quais repudia o trabalho do
biógrafo. Este, se o desejar, provoque o Poder Judiciário para, então assim,
obter a autorização judicial para a almejada publicação.
Equiparam-se os dois
direitos fundamentais, impedindo-se que aconteça “o mal já está feito”, que
mesmo ulterior e, certamente, bem tardia condenação do biógrafo, irresponsável
e mesmo criminoso, justo por ser ulterior e tardia não se faz justa.
Retornemos ao açodamento
midiático.
E eis que, premida pelas
manchetes de jornais, delegada de polícia dá por concluída investigação sobre o
latrocínio que vitima, médico que pedalava sua bicicleta na Lagoa Rodrigo de
Freitas, no Rio de Janeiro.
Menores são apontados
como os autores desse crime.
Desencadeia-se a
excitação coletiva, direcionada à solução única, imediatista: que seja reduzida
a maioridade penal.
Com o mero jogo de
números, de 18 para 16 anos de idade, os prestidigitadores da política, sempre
à caça de votos e permanência no poder, no embalo da profusão midiática, vendem
esse “elixir da segurança pública”.
Olhos vendados, ninguém
suscita o debate sobre a educação em nosso País, objetivando a adoção de
medidas sérias e concretas para o resgate de valores fundantes, tais: a
primazia da vida, a produção do conhecimento, a manifestação cultural ofertadas
indiscriminadamente, e com qualidade.
Medidas sérias e
concretas que signifiquem guinada radical (= que vá às raízes e não fique na
superfície) no exercer o mandato governamental, cujo primeiro passo caracterize
o priorizar a política educacional, a política alimentar, a política de saúde e
colocar, em segundo plano, os instrumentos – é isso mesmo que são – os
instrumentos econômico-financeiros, medidas sérias não são implementadas.
Em “pátria educadora”, o
cenário tem como ator principal o Ministro da Educação e não o da Fazenda.
Senão, “pátria educadora” é mais um slogan
vazio e oportunista.
Leio que o latrocínio acontecido na Lagoa Rodrigo de Freitas está todo embaralhado. A investigação
concluída, não mais está concluída: foi reaberta.
Leio, também, que o
Supremo Tribunal Federal decidirá, ainda este ano, sobre a oferta do ensino
religioso nas escolas públicas. Bem, esse tema ainda não está decidido; é
salutar que o analisemos quando decidido for, desejando que não seja
compreendido no: “cala a boca já morreu”. A propósito, e encerrando estas
reflexões, mais uma vez tão pertinentes considerações do Papa Francisco:
“256. Ao questionar-se sobre a incidência pública da
religião, é preciso distinguir diferentes modos de vivê-la. Tanto os intelectuais como os jornalistas caem, freqüentemente, em
generalizações grosseiras e pouco acadêmicas, quando falam dos defeitos das
religiões e, muitas vezes, não são capazes de distinguir que nem todos os
crentes – nem todos os líderes religiosos – são iguais. Alguns políticos
aproveitam esta confusão para justificar ações discriminatórias. Outras vezes,
desprezam-se os escritos que surgiram no âmbito de uma convicção crente, esquecendo que os textos religiosos
clássicos podem oferecer um significado para todas as épocas, possuem uma força
motivadora que abre sempre novos horizontes, estimula o pensamento, engrandece
a mente e a sensibilidade. São desprezados pela miopia dos racionalismos.
Será razoável e inteligente relegá-los para a obscuridade só porque nasceram no
contexto de uma crença reli possuem um valor racional, apesar de estarem
permeados de símbolos e doutrina religiosos.” ( leia-se Evangelii Gaudium nº
256 – pg. 199/200).
Um comentário:
Dr. Fonteles,
Se possível, no próxima post gostaria que falasse sobre a Encíclica Laudato Si.
Paz e bem,
Omena
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