É uma pergunta que me tenho feito não
só no curso desses anos, quando ele possui o mandato eletivo, mas que
necessariamente me remete à análise do porquê de sua vitória na eleição
presidencial e do porquê busca reeleger-se.
Sem dúvida, de plano desponta o
sucesso de bem urdida cobertura da grande mídia, patrocinada pelos setores mais
conservadores do mundo financeiro-empresarial, cujo eco ressoou no parlamento,
caracterizando a administração governamental petista como corrupta.
Como é exitoso nesse tipo de condução
midiática, indispensável seja apresentado ao povo um herói com a bandeira de
honestidade, de restauração de valores, de ilibada conduta, tudo muito apropriado
à figura de um juiz que, na ocasião, não tinha sua conduta funcional tisnada
pelo que, depois, se consolidou em manifestos comportamentos de parcialidade no
julgar.
Por outra perspectiva, vitimizar-se
Jair Bolsonaro no episódio mal esclarecido de uma facada – recorde-se que
Adélio Bispo, o agressor, não teve sequer um fio de cabelo tocado logo após a
sua ação, quando notório é que os seguidores de Jair Bolsonaro, que cercavam
Adélio Bispo, notabilizam-se por adotarem condutas de extrema agressividade em
defesa de seu líder – e imputar esse quadro de vitimização aos opositores
petistas foi facilmente deglutido por amplos segmentos da população.
Também a manipulação real das redes
sociais, alimentada, ininterrupta e freneticamente, por toda a sorte de fake news, é fator vital para a satanização
de quem se deseja derrotar em quadro eleitoral.
Estimo, ainda, presente o que subjaz,
em nosso ser, de recôndito ou abertamente preconceituoso em relação à pessoa,
desconsiderada socialmente por ser de patamar, dito inferior, tal sucedeu, e
sucederia, com a ascensão de operário a, de novo, liderar a nação brasileira.
É de se considerar, outrossim, que
equívocos aconteceram no pôr em prática o chamado “presidencialismo de
coalizão”, erros cometidos que se traduziram na entrega, pura e simplesmente,
aos partidos políticos coligados, sem qualquer controle sobre como geriam o
recebido, de espaços vários da administração pública em caolha concepção do
exercício do poder porque circunscrita à visão do poder político como status e fim em si mesmo, quando o poder
só tem razão de ser se vocacionado à realização constante do bem comum.
Muito a propósito, o sábio
ensinamento do Compêndio da Doutrina Social da Igreja sobre: “as tarefas da
comunidade política”.
“168. A
responsabilidade de perseguir o bem comum compete não só às pessoas
consideradas individualmente, mas também ao Estado, pois que o bem comum é a
razão de ser da autoridade política. Na verdade, o Estado deve garantir
coesão, unidade, e organização à sociedade civil de que é expressão, de modo
que o bem comum possa ser conseguido com o contributo de todos os cidadãos. O
indivíduo humano, a família, os corpos intermédios não são capazes por si
próprios de chegar a seu pleno desenvolvimento; daí serem necessárias as
instituições políticas, cuja finalidade é tornar acessíveis às pessoas os bens
necessários – materiais, culturais, morais, espirituais – para levar uma vida
verdadeiramente humana. O fim da vida
social é o bem comum historicamente realizável”. (Compêndio da Doutrina
Social da Igreja nº 168 – pg. 103 - grifos do original e meus).
Não é possível que
persistamos com um personagem tão alienado porque tão alheio ao que, realmente,
importa, que são os valores de convivência respeitosa, ainda que no dissenso;
os valores que nada, nem a ninguém, discriminam porque significam a inclusão
plena para que todas e todos possam, na dimensão de cada qual, porque assim não
há excluídas ou excluídos, usufruir dos bens “materiais, culturais, morais,
espirituais” em sua integralidade.
Personagem tão
despreparado à liderança porque, perdido em constantes atitudes pessoais
grotescas – quem não se lembra da cena de estar a correr atrás de uma ema
brandindo o remédio cloroquina – destituídas de qualquer sentido valoroso.
Cabe, porque tão
oportunas, rememorarmos, aqui e agora, palavras do Papa Paulo VI escritas na
Carta Encíclica Populorum Progressio “sobre o desenvolvimento dos povos”:
“35. Pode mesmo afirmar-se que o crescimento econômico
depende, em primeiro lugar, do progresso social. Por isso a educação de base é
o primeiro objetivo dum plano de desenvolvimento. A fome de instrução não é menos deprimente que a falta de alimentos: um
analfabeto é um espírito subalimentado. Saber ler e escrever, adquirir uma
formação profissional, é ganhar confiança em si mesmo e descobrir que pode
avançar com os outros. Como dizíamos na nossa mensagem ao Congresso da UNESCO,
em Teerã, no ano de 1965, a alfabetização é para o homem fator primordial de integração social e de enriquecimento da pessoa e,
para a sociedade, instrumento privilegiado de progresso econômico e
desenvolvimento”. (Carta Encíclica Populorum Progressio nº 35 – pg. 30 –
grifos do original e meus).
Não há “plano de
desenvolvimento” algum.
O projeto é a
permanência no poder como usufruto pessoal, familiar e de amigos.
De total pertinência no
quadro assim sintetizado, as palavras do Papa Francisco sobre os dois tipos de
lideranças populares. Ele ensina:
“159. Existem
líderes populares, capazes de interpretar o sentir de um povo, sua dinâmica
cultural e as grandes tendências de uma sociedade. O serviço que prestam,
congregando e guiando, pode ser a base para um projeto duradouro de
transformação e crescimento, que implica também a capacidade de ceder o lugar a
outro na busca do bem comum. Mas degenera em um populismo insano quando se
transforma na habilidade de alguém de atrair consensos a fim de
instrumentalizar politicamente a cultura
do povo, sob qualquer sinal ideológico, a serviço do seu projeto pessoal e de
permanência no poder. Outras vezes, procura aumentar a popularidade fomentando
as inclinações mais baixas e egoístas de alguns setores da população. E o caso
agrava-se quando se pretende, com formas rudes ou sutis, o servilismo das
instituições e da legalidade”. (Carta Encíclica Fratelli Tutti nº 159 – pg.
85).
Necessitamos aprender
ser imperativo a construção da cidadania ativa porque participativa, expressa
em tantos movimentos sociais estimulados e, então, presentes em paróquias,
conjuntos residenciais e de bairros, agremiações de serviço, organizações não
governamentais, etc.
De novo, o Papa
Francisco sobre a nobreza da verdadeira atividade política:
“Por isso, a vida política autêntica, que se funda no direito
e em um diálogo leal entre os sujeitos, renova-se com a convicção de que cada
mulher, cada homem e cada geração carregam em si uma promessa que pode irradiar
novas energias relacionais, intelectuais, culturais e espirituais.
197. Vista dessa maneira, a política é
mais nobre do que a aparência, o marketing,
as diferentes formas de disfarce da mídia. Tudo isso semeia apenas divisão,
inimizade e um ceticismo desolador incapaz de apelar para um projeto comum. Ao
pensar no futuro, alguns dias as perguntas devem ser: Para quê? Para onde estou
realmente indo? Passados alguns anos, ao refletir sobre o próprio passado, a
pergunta não será: Quantos me aprovaram, quantos votaram em mim, quantos
tiveram uma imagem positiva de mim? As
perguntas, talvez dolorosas, serão: “Quanto amor coloquei no meu trabalho? Em
que fiz progredir o povo? Que marcas deixei na vida da sociedade? Que laços
reais construí? Que forças produtivas desencadeei? Quanta paz social semeei? O
que produzi no lugar que me foi confiado? Carta Encíclica Fratelli Tutti nº
196/197 – pg. 103/104).
Tudo assim posto, uma
certeza: Não é mais possível porque, na verdade, nunca o foi, Bolsonaro.
Paz e Bem.
Muito bom seu texto.
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