quarta-feira, 10 de setembro de 2014

IGREJA E PARTICIPAÇÃO POLÍTICA ( II )

                    

Prosseguindo no exame do Projeto de Lei de Iniciativa Popular, chamado “Reforma Política Democrática e Eleições Limpas”, objeto de nosso artigo anterior, destaco, também como aspecto de positiva relevância, o tratamento conferido ao financiamento das campanhas políticas.
O financiamento circunscreve-se a doações advindas de pessoas físicas, até o valor de R$ 700,00 por pessoa, até que se atinja 40% da quota do Fundo Democrático de Campanhas, que caiba ao maior partido, e por valores postos na lei orçamentária, valores esses definidos pelo Tribunal Superior Eleitoral e que constituem o dito Fundo Democrático de Campanhas, gerido exclusivamente pelo mesmo Tribunal Superior Eleitoral.
A colaborar com o Tribunal Superior Eleitoral na relevante missão do controle real do financiamento das campanhas, a Justiça Eleitoral forma, em cada circunscrição eleitoral, forum de controle social do Fundo Democrático, forum composto pelo Ministério Público eleitoral; Ordem dos Advogados do Brasil, entidades e organizações da sociedade civil e representantes dos partidos políticos.
O Tribunal Superior Eleitoral é que, a partir de 5 de julho do ano eleitoral, fará a distribuição de 2/3 dos recursos destinados ao primeiro turno, depositando-os diretamente nas contas específicas de campanha dos partidos e até a citada data o Tribunal Superior Eleitoral divulgará relação indicando o total de recursos destinados a cada partido, para cada cargo em disputa, em cada circunscrição.
Desenvolvendo essa extremamente salutar diretriz de absoluto controle do Tribunal Superior Eleitoral sobre o financiamento das campanhas políticas, o Projeto impõe:
- que as receitas e despesas de campanha sejam lançadas em até 24 horas de sua realização no Sistema de Prestação de Contas Eleitorais no site eletrônico do Tribunal Superior Eleitoral com acesso on line ao extrato da conta específica de campanha;
- o pagamento das despesas de campanha com cartão de débito ou transferência bancária e, no caso da impossibilidade dessas alternativas, utilize-se cheque nominal cruzado, não endossável;
- que os partidos políticos só movimentem os recursos de campanha mediante cartão de débito ou transferência bancária;
- que a contratação de pessoas para a campanha seja precedida de contrato escrito em modelo disponibilizado no site eletrônico da Justiça Eleitoral, discriminando-se: qualificação completa das partes; atividade a ser desempenhada pelo contratado; horário e local de trabalho e o período da contratação. A remuneração dos contratados só pode advir de recursos provenientes do Fundo Democrático de Campanhas ou das doações de pessoa físicas;
- que os partidos políticos, coligações e candidatos ficam obrigados, durante a campanha, a divulgar pela internet, em tempo real, a movimentação financeira realizada, com a discriminação dos gastos realizados, em site criado pela Justiça Eleitoral para esse fim;
- que os partidos políticos devam manter registro contábil relativo às receitas e despesas, na observância das normas editadas pelo Tribunal Superior Eleitoral para garantir a identificação e discriminação das receitas e despesas por destinação dos recursos, de forma padronizada entre todos os partidos políticos.
O Projeto, marcando o protagonismo do Tribunal Superior Eleitoral na condução das eleições em nosso País, determina que esse Colegiado mantenha sistema de registro centralizado das informações referentes ao orçamento dos partidos políticos, incluída sua execução pormenorizada, garantindo-se às cidadãs e cidadãos brasileiros “amplo acesso em meio eletrônico”, para tanto instituindo e regrando o Sistema de Informação sobre Orçamento dos Partidos Políticos: SIOPP.
O Tribunal Superior Eleitoral deve instituir programa educativo “de forma a orientar a sociedade civil a exercer o controle social sobre as campanhas eleitorais e a aplicação dos recursos públicos destinados ao Fundo Partidário.”
Não resta a menor dúvida que se faz de total valia, insisto, o protagonismo do Tribunal Superior Eleitoral no eficaz controle do financiamento das campanhas políticas, o que se coroa com a expressa proibição das pessoas jurídicas de efetuarem “direta ou indiretamente doações para as campanhas eleitorais”.
Com efeito, o quadro atual, que conspurca a democracia brasileira, mantém incólume a destinação indiscriminada e incontrolada de verbas consideráveis por entidades financeiras, industriais, agrárias, comerciais, da construção civil, para a eleição de candidatos que, uma vez eleitos, obviamente dispor-se-ão, assim comprometidos, ao exercício do mandato de cabresto.
A meu juízo, necessitamos mais.
Há de se estabelecer o princípio segundo o qual: política não é profissão; o político não tem na política a sua profissão.
Ora, disso decorre, inelutavelmente, que não há lugar para a reeleição.
Mandato político só se pode cumprir por uma única vez, por 5 anos. Depois, torne o parlamentar à sua profissão. Se não deseja afastar-se da atividade político-partidária, que atue nos quadros partidários da agremiação escolhida, exercendo cargos ou funções que ela lhe ofereça. O mandato popular, todavia, só se exerce por uma única vez, impedindo-se  de cumpri-lo, por sucessão, parentes até o 3º grau.
As enormes mazelas, ocasionadas pela perpetuação dos detentores de mandatos eletivos, sem sombra para dúvidas, assim são evitadas.
Quem sabe da sociedade brasileira nasça proposta de emenda constitucional para o fim da reeleição em todos os níveis, pelo fim do político profissional.
Encerro com duas transcrições, hauridas do Compêndio da Doutrina Social da Igreja, trabalho profundamente enriquecedor do Magistério da Igreja Católica que, lamentavelmente, é desconhecido por grande número de católicas e católicos.
Diz, a propósito das “tarefas da comunidade política”, esse Documento:
“168. A responsabilidade de perseguir o bem comum compete não só às pessoa consideradas individualmente, mas também ao Estado, pois que o bem comum é a razão de ser da autoridade política. Na verdade, o Estado deve garantir coesão, unidade e organização à sociedade civil de que é expressão, de modo que o bem comum possa ser conseguido com o contributo de todos os cidadãos. O indivíduo humano, a família, os corpos intermédios não são capazes por si próprios de chegar a seu pleno desenvolvimento; daí serem necessárias as instituições políticas, cuja finalidade é tornar acessíveis às pessoas os bens necessários – materiais, culturais, morais, espirituais – para levar uma vida verdadeiramente humana. O fim da vida social é o bem comum historicamente realizável.” ( leia-se: Compêndio da Doutrina Social da Igreja – pg. 103 ).
E, sobre o fundamento e finalidade da comunidade política, ensina o Documento:
“385. A comunidade política tem na referência ao povo a sua autêntica dimensão: ela é, e deve ser, na realidade, a unidade organizadora de um verdadeiro povo.  O povo não é uma multidão amorfa, uma massa inerte a ser manipulada e instrumentalizada, mas sim um conjunto de pessoas, cada uma das quais – no próprio lugar e a seu modo – tem a possibilidade de formar a própria opinião a respeito da coisa pública e a liberdade de exprimir a própria sensibilidade política e de fazê-la valer em maneira consoante com o bem comum.” ( leia-se: Compêndio da Doutrina Social da Igreja – pg. 219). 
  


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