Preceitua o artigo 129 e seu inciso I de nossa Constituição
Federal:
Artigo 129 – “São funções institucionais do Ministério Público:
I –
Promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei”.
Isso significa que somente os membros do Ministério
Público – “promover privativamente -
podem acusar alguém ante o Poder Judiciário pelo cometimento de crime
que ofenda não só a pessoa, mas a coletividade, para isso promovendo a ação
penal pública.
Separadas e autônomas
são, portanto, no processo criminal brasileiro as funções de acusar – tarefa
exclusiva dos membros do Ministério Público, repito – e de julgar, essas
entregues aos juízes, desde o 1º grau de jurisdição até aos ministros de nossa
Corte maior de Justiça: o Supremo Tribunal Federal. É o chamado sistema
processual acusatório, garantia da cidadania, expressão da democracia porque
países há em que as funções de investigar, acusar e julgar concentram-se em
pessoa única: o juiz, no denominado sistema processual inquisitório.
Portanto, no sistema
processual acusatório o membro do Ministério Público não pode ser espectador, não pode ser procrastinador.
Tem o inafastável dever
de se definir por acusar – age positivamente -; de se definir por propor o
arquivamento do que investigou, por considerar que crime não há, ou porque a
pessoa investigada não é a autora do crime acontecido – age negativamente –; ou
se conduz pela necessidade de se continuar com a investigação, apontando,
objetivamente, que diligências devem ser realizadas.
Justo a que sempre se
posicione, e jamais abdique de fazê-lo, ou o faça acanhadamente, a própria
Constituição Federal estatui, expressamente, como princípio institucional: a independência funcional (artigo 127 § 1º da Constituição Federal).
Em nosso sistema
constitucional pessoas há, não por si, mas pelo cargo que ocupam, e enquanto o
ocupam, que devem ter suas condutas avaliadas não pelo juiz de 1º grau, mas
pelos colegiados superiores.
Tal se dá, por exemplo,
no exame de condutas do presidente da República, de ministros de Estado, de
senadores da República, de deputados da Federação.
Nesses casos
exemplificados, o processo criminal tramita e é definido, originariamente, no
Supremo Tribunal Federal e o Promotor natural para se posicionar ante tais
fatos, imputados a ditas pessoas, é o procurador-geral da República.
Mas, e se o
procurador-geral da República se omite no desempenho de tão relevante
atribuição?
Antes de se responder a
essa indagação, importa perquirir: como caracterizar a omissão?
Indicativo inicial do
quadro omissivo está no delegar essa atribuição, que lhe é própria, a pessoa de
sua mais estrita confiança: o vice-procurador geral da República, porque pessoa por ele escolhido em ato
pessoal e monocrático.
Depois, aquiescer com
manifestações processuais do vice-procurador geral da República que traduzem se
comportar, funcionalmente, como mero
espectador ao invés de assumir o protagonismo investigatório; postura essa de mero espectador que enseja
deliberações judiciais no sentido de que só se abra vista do caderno
investigatório ao procurador-geral da República após cumpridas todas as
diligências deferidas judicialmente; ou no sentido de se fixar prazo para que o
procurador-geral da República se pronuncie; ou, ainda, no sentido de que seja
questionado o procurador-geral da República sobre o porquê de não ter proposto
a investigação sobre pessoas, cujo posicionamento no desenrolar dos fatos não
autoriza sejam excluídas da apuração.
Formado esse quadro,
que bem caracteriza a omissão funcional, necessário, agora, que tornemos à
pergunta: “Mas, e se o procurador-geral da República se omite no desempenho de
tão relevante atribuição”, mormente se os fatos se constituem em condutas
antidemocráticas a envolver a segurança e independência do Supremo Tribunal
Federal e de seus ministros, e também conduta funcional do presidente da
República, passível de exame sob a ótica do delito de prevaricação?
Incide, plenamente, à
espécie o disposto no artigo 57, inciso X, da Lei Complementar nº 75/93:
Artigo 57 – “Compete ao Conselho Superior do Ministério
Público Federal:
X –
Designar Subprocurador-Geral da República para conhecer de inquérito, peças de
informação, ou representação sobre crime comum atribuível ao Procurador-Geral
da República e, se for o caso, promover a ação penal”.
Por óbvio: para essa
deliberação impedidos estão de nela participarem, por qualquer modo, o próprio
procurador-geral da República e seu vice-procurador geral da República.
Eis palavras, para mim
tão apropriadas, do Papa Francisco, proferidas no Palácio Presidencial de
Bagdá, no dia 5 de março do ano em curso, por ocasião de Reunião com as
Autoridades, a Sociedade Civil e Corpos Diplomáticos ao ensejo de sua Jornada
Apostólica ao Iraque:
“É necessário enfrentar o flagelo da corrupção, do abuso de
poder, e da ilegalidade, mas não basta. Ao mesmo tempo, é preciso construir
justiça, aumentar a honestidade, a transparência e fortalecer as instituições
responsáveis por isso”.
Encerro com o trecho
final da “Nota da CNBB diante do atual momento brasileiro” dada a público em 9
de julho do ano em curso:
“Apoiamos e conclamamos às instituições da República para
que, sob o olhar da sociedade civil, sem se esquivar, efetivem procedimentos em
favor da apuração, irrestrita e imparcial, de todas as denúncias, com
consequências para quem quer que seja, em vista de imediata correção política e
social dos descompassos. ”
Paz
e Bem.
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