quinta-feira, 24 de julho de 2014

Vida que segue

                                                
“Vida que segue”, expressão tantas vezes ouvida quando dissabores, infortúnios e fortes tristezas acontecem.
Sim, “vida que segue”, mas necessário se faz que o que passou não seja, simplesmente, descartado como algo inútil, ou que se deva esquecer.
“Vida que segue”, mas a partir do aprendizado do que se viveu.
Bem recentemente, todos quantos gostam de esporte, especificamente de futebol, experimentaram grande dissabor.
Em competição a nível mundial, nossa, dita seleção, foi medíocre, avassaladoramente medíocre.
Reflitamos, portanto.
O comando do futebol, a melhor dizer, de todas as modalidades esportivas em nosso País, é confiado a associações privadas cujos mandantes – creio que o melhor termo seja mesmo esse: mandantes – são pessoas que mandam e desmandam arbitrariamente; perpetuam-se no mando, por décadas; utilizam-se dessas entidades para o enriquecimento pessoal em inescrupuloso compadrio. Apesar de manejarem verbas públicas e desenvolverem atividades que atingem patamar nacional não se sujeitam a qualquer controle.
Permanecendo esse o quadro, nos contentaremos com espasmos de vitoriosas conquistas dentro de realidade marcada pelo desempenho ruim, quando não pífio, situação típica de País desorganizado e amador.
Urge que se fixe período único, vedada a recondução, período definido no quadriênio, findo o qual tais pessoas necessariamente retirem-se da direção dessas entidades, e aconteça, então, a imprescindível e contínua renovação de pensamento e ação.
Urge que a direção monocrática dessas entidades – a presidência – seja desfeita e, em seu lugar, a direção das mesmas passe a consolidar-se em colegiado – comissão diretora – integrado por um representante dos atletas da modalidade esportiva; um representante dos técnicos e um representante das associações esportivas em causa: a direção em triunvirato.
Urge que se legitime o Ministério Público, dada a inserção de verbas públicas a subsidiar ações dessas entidades e a emigração descontrolada de jovens brasileiros para o exterior, para o exercício do controle externo sobre essas entidades, com todos os consectários disso decorrentes, ou seja, a provocação do Poder Judiciário sempre que necessária a adoção de medidas judiciais a que seja sanado o descontrole, a irresponsabilidade e a má-fé na gestão dessas entidades.
Reflitamos, ainda:
O culto, provocado pelo sensacionalismo midiático, ao egocentrismo, ao chamado craque – e quantos craques mensais, e mesmo quinzenais, grande parte da mídia esportiva não se cansa de “produzir” -, traduzido na máxima: “a seleção é Fulano e mais dez”; esse culto, quase que idolátrico a ocupar mentes desavisadas, propicia eloquente desserviço.
Trago, aqui, porque as tenho por oportunas e sábias, palavras do Papa Francisco, na sua Exortação Apostólica: “A Alegria do Evangelho”:
“2. O grande risco do mundo atual, com sua múltipla e avassaladora oferta de consumo, é uma tristeza individualista que brota do coração comodista e mesquinho, da busca desordenada de prazeres superficiais, da consciência isolada. Quando a vida interior se fecha nos próprios interesses, deixa de haver espaço para os outros...” ( consulte-se: A Alegria do Evangelho – pg. 3/4 ).
Aí está: certamente que nos esportes coletivos – futebol, vôlei, basquete, etc. – um, ou mais de um, atleta se sobressai dos demais por sua qualidade técnica, mas esse dado, até óbvio dada a especificidade das aptidões entre as pessoas, que felizmente as impedem de serem tratadas massivamente, em bloco supressivo das individualidades, esse dado, repito, jamais há de autorizar o endeusamento, o estrelato superficial, vazio e inútil do “herói da partida”.
Heróis são todos os que se dispuseram ir ao campo, ir à quadra, e, praticando sadiamente o esporte, buscar a vitória.
A expressão, aqui já mencionada sob o enfoque futebolístico – “a seleção é Fulano e mais dez” – é superada, e desaparece irrefragavelmente diante da sabedoria popular que dita: “ uma andorinha só não faz verão”.
Mister se faz que tenhamos sempre em mente a equipe, o conjunto de atletas, o esforço coletivo, e se se tem a necessidade da escolha do melhor, que a escolha se faça como que a premiar o que melhor refletiu o conjunto, e o escolhido se sinta como a síntese de todos os demais companheiros no jogo realizado.
Quem sabe assim, de par com o desejo, natural e válido, a animar o atleta de obter proveito pessoal para si, e para seus familiares, mais das vezes a que consiga ultrapassar nível da crônica desigualdade econômica e social em que está inserido, esse mesmo atleta possa compreender o inestimável valor de ser em conjunto, do jogar coletivamente, da responsabilidade social de suas ações. A propósito, nunca é demais rememorarmos as palavras do Papa Francisco, presentes em outro trecho da Exortação Apostólica “A Alegria do Evangelho”, delas me valendo para encerrar este artigo:
“Para se poder apoiar um estilo de vida que exclui os outros ou mesmo entusiasmar-se com este ideal egoísta, desenvolveu-se uma globalização da indiferença. Quase sem nos dar conta, tornamo-nos incapazes de nos compadecer ao ouvir os clamores alheios, já não choramos à vista dos dramas dos outros, nem nos interessamos por cuidar deles, como se tudo fosse uma responsabilidade de outrem, que não nos incumbe. A cultura do bem-estar anestesia-nos a ponto de perdermos a serenidade se o mercado oferece algo que ainda não compramos, enquanto todas estas vidas ceifadas por falta de possibilidades nos parecem um mero espetáculo que não nos incomoda de forma alguma.”( consulte-se: A Alegria do Evangelho – pg. 49 ).  



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