quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

TRÁFICO HUMANO

                                                  
          A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB – propõe-nos o  tema “Fraternidade e Tráfico Humano” ao ensejo da Campanha da Fraternidade para este ano de 2014.
          Diz o Papa Francisco: “O tráfico de pessoas é uma atividade ignóbil, uma vergonha para as nossas sociedades que se dizem civilizadas.” (Texto-Base da Campanha nº 7 – pg. 11 ).
          Certamente assim o é porque o tráfico humano dilacera a dignidade da pessoa.
          Instrumentalizada, faz-se em objeto da ganância da atividade econômica erigida em objetivo supremo da razão de viver, e crianças são lançadas em carvoarias a trabalhar por forma inclemente; jovens mutilam-se nos canaviais ao corte da cana, ou padecem sob condições degradantes de trabalho, reduzidos que estão à condição análoga à de escravos; famílias inteiras amontoam-se em cortiços, que são as próprias oficinas do trabalho manual de costura e tecelagem a que se submetem.
          Diz bem o Texto-Base da Campanha, avivando-nos os ensinamentos das Cartas Encíclicas “Sollicitudo Rei Socialis” e “Centesimus Annus”, ambas do Papa João Paulo II:
          “O mundo contemporâneo vive sob o domínio da injustiça e de um sistema cimentado nas estruturas de pecado. Tais estruturas estão ainda mais fortalecidas, agudizando a dramática situação dos mais pobres.” (Texto-Base: nº 158 – pg. 56).
          Como permanecer, quem quer que seja, insensível a essa realidade?
          Presente em mim, aqui e agora, a eloquente afirmação de S. Paulo, dirigida aos gálatas, na ocasião, e a todos nós, para sempre: “É para a liberdade que Cristo nos libertou.”
          Com efeito, a liberdade não é, como tanto se apregoa nos dias em curso, a absolutização da autonomia do eu, alimentando-se de encontros casuais, fortuitos, ou ditados pelo pragmatismo interesseiro; não é o eu centrado em si mesmo, medindo o outro na frieza da relação custo-benefício a que subjaz a fria pergunta: o quanto eu ganho com você?
          Somos livres para que, libertos de nossas egoísticas amarras,  nos entreguemos ao outro, que não está fora de nós, ou nos é alheio, mas que pelo amor-doação faz-se em nosso “outro eu”; e, por tal maneira de ser, com o outro nos envolvemos, realmente, em verdade e justiça. Ou como está muito bem posto no Texto-Base:
          “138. Jesus ensina que a compaixão implica em sofrer a dor do outro, com o outro... Deus, em Jesus, se expõe à dor das criaturas, se deixa afetar.” ( pg. 51 ).
          Por óbvio, não se está, aqui, a fazer o apanágio do sofrimento. Se é certo que o sofrimento é inescapável da condição humana, é igualmente certo que o ser livre supera esse acontecimento próprio da condição humana, tornando-o, como mesmo disse, mero acontecimento, porque a vivência evangélica da liberdade ultrapassa os limites da condição humana.
          Nesse sentido, compreendo as palavras tão verdadeiras do Papa Francisco, ditas no dia 8 de julho do ano passado, em Lampedusa, local de tantas mortes, por afogamento, de desesperados emigrantes africanos, manipulados pelos “senhores” do tráfico humano:
          “Somos uma sociedade que esqueceu a experiência de chorar, de padecer com; a globalização da indiferença tirou-nos a capacidade de chorar.” ( Texto-Base – pg. 102).
          E definitivas, para mim, são também, no mesmo contexto, essas expressões do Papa Francisco:
          “... perdemos o sentido da responsabilidade fraterna; caímos na atitude hipócrita do sacerdote e do levita de que falava Jesus na parábola do Bom Samaritano: ao vermos o irmão quase morto na beira da estrada, talvez pensemos “coitado” e prosseguimos o nosso caminho, não é dever nosso; e isto basta para nos tranqüilizarmos, para sentirmos a consciência em ordem. A cultura do bem-estar, que nos leva a pensar em nós mesmos, torna-nos insensíveis aos gritos dos outros, faz-nos viver como se fôssemos bolas de sabão: estas são bonitas, mas não são nada, são pura ilusão do fútil, do provisório. Esta cultura do bem-star leva à indiferença a respeito dos outros; antes, leva à globalização da indiferença. Neste mundo da globalização, caímos na globalização da indiferença. Habituamo-nos ao sofrimento do outro, não nos diz respeito, não nos interessa, não é responsabilidade nossa.” ( Texto-Base – pg. 103/104 ).
          Possamos todos com atos concretos, responsáveis e firmes, no espaço pessoal, familiar, profissional e comunitário não deixar que a Campanha da Fraternidade seja mero assunto de conversa, ou de teóricas digressões, mas nos impulsione em motivação bastante e eficaz para a ação livre.
        
              


           

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