terça-feira, 4 de agosto de 2015

LAUDATO SI



Vou me deter na análise da Carta Encíclica do Papa Francisco, que assim se apresenta – Laudato Si (Louvado seja) -, atendendo a sugestões de pessoas amigas, nesse sentido.
Marcando que esse escrito é instrumento de “diálogo com todos acerca da nossa casa comum” (Laudato Si – pg. 4, grifei), Francisco reafirma seu testemunho concreto de oferecer-se a mulheres e homens de todos os credos religiosos, ou sem credo algum, em perene empenho de ouvir e dizer, ou seja, de dialogar, sem preconceitos ou predisposições.
Relembra-nos sábias palavras do Papa Paulo VI, em discurso na FAO (Food Alimentary Organization), por ocasião do 25º aniversário desse importante organismo da ONU (Organização das Nações Unidas), proferidas há 45 anos, e completamente confirmadas nos dias de hoje. Disse, e é de se repetir, Paulo VI da possibilidade de uma “catástrofe ecológica sob o efeito da explosão da civilização industrial”, proclamando:
“a necessidade urgente de uma mudança radical no comportamento da humanidade, porque os progressos científicos mais extraordinários, as invenções técnicas mais assombrosas, se não estiverem unidos a um progresso social e moral, voltam-se necessariamente contra o homem.” (leia-se: Laudato Si – pg. 4/5).
No magistério do Papa Bento XVI, o Papa Francisco alerta-nos para o grave equívoco que perpetramos.
“O Papa Bento XVI propôs-nos reconhecer que o ambiente natural está cheio de chagas causadas pelo nosso comportamento irresponsável: o próprio ambiente social tem as suas chagas. Mas, fundamentalmente, todas elas ficam a dever ao mesmo mal, isto é, à ideia de que não existem verdades indiscutíveis a guiar a nossa vida, pelo que a liberdade humana não tem limites. Esquece-se que o homem não é apenas uma liberdade que se cria por si própria. O homem não se cria a si mesmo. Ele é espírito e vontade, mas também é natureza. Com paterna solicitude, convidou-nos a reconhecer que a criação resulta comprometida onde nós somos a última instância, onde o conjunto é simplesmente nossa propriedade e onde o consumimos somente para nós mesmos. E o desperdício da criação começa onde já não reconhecemos qualquer instância acima de nós, mas vemo-nos unicamente a nós mesmos.” (leia-se: Laudato Si – pg. 7, grifei).
Ver-se unicamente a si mesmo” é a razão de ser da corrupção: tudo, em nós, centralizamos; de todos, a nós, impomos reverência, subjugação, bajulação.
A administração da polis (= cidade), a política, completamente distorcida de sua relevante razão de ser, exalta-nos no poder pelo poder, instrumentalizado na compra e venda de espúrias negociatas. O bem comum, o cuidado com a casa comum são expressões extintas, ou manipuladas por agentes públicos, que se fazem “última instância”, onde tudo lhes pertence, para que de tudo possam consumir, exclusivamente.
Essa concepção ufanista é medíocre como, aliás, são todas as concepções ufanistas.
É medíocre porque completamente incapaz de perceber a sacramentalidade do mundo, na partilha sem fronteiras.
Eis porque o Papa Francisco brinda-nos com palavras do Patriarca Ecumênico Bartolomeu, carregadas de sentido, e de poesia:
“... aceitar o mundo como sacramento de comunhão, como forma de partilhar com Deus e com o próximo em uma escala global. É nossa humilde convicção que o divino e o humano se encontram no menor detalhe da túnica inconsútil da criação de Deus, mesmo no último grão de poeira de nosso planeta.” (leia-se: Laudato Si – pg. 9/10).
Com essa transcrição, preparada está, em absoluta coerência, a reflexão que o Papa dedica a São Francisco de Assis, no contexto de sua Carta Encíclica. Ele diz:
“Acho que Francisco é o exemplo por excelência do cuidado pelo que é frágil e por uma ecologia integral, vivida com alegria e autenticidade.” (leia-se: Laudato Si – pg. 10).
Sim, eis a palavra-chave, para mim, de todo o ensinamento evangélico: cuidar.
O Deus-Amor, Jesus, o Cristo (= ungido) ensinou-nos e ensina-nos que amar é cuidar: acolhendo; sentando-se à mesa com; caminhando com; enfim pondo-se em comunhão. Toda comunhão é ato-momento de deixar-se cuidar por Deus para por-se a cuidar da irmã e do irmão.
Colho ideia tão apropriada do Papa Francisco, a propósito:
“A pobreza e a austeridade de São Francisco não eram simplesmente um ascetismo exterior, mas algo mais radical: uma renúncia a fazer da realidade um mero objeto de uso e domínio.” (leia-se: Laudato Si – pg. 12 grifei).
E, outra passagem, em sintonia fina com a que venho de transcrever:
O mundo é algo mais do que um problema a resolver; é um mistério gozoso que contemplamos na alegria e no louvor.” (leia-se: Laudato Si – pg. 12/13, grifei).
Crises, não há porque temê-las. Faz-se mister que existam. Hão de ser vistas como desafios a que melhor nos conheçamos, portanto, a que descubramos nossa verdade comum, construída a cada dia, com o concurso de todos.
Encerro este artigo com consideração final, posta em esperança, com que o Papa Francisco termina a apresentação, tão rica em ensinamentos da Laudato Si. Disse o Papa Francisco, em apelo:
“Espero que esta carta encíclica, que se insere no magistério social da Igreja, nos ajude a reconhecer a grandeza, a urgência e a beleza do desafio que temos pela frente.” (leia-se: Laudato Si – pg. 14).
No artigo do próximo mês, concedam-me, amigas leitoras e amigos leitores, continuar conversando com vocês sobre tão fundamental Documento.




2 comentários:

  1. Muito bom. Claudio, acho que deveria escrever um livro sobre São Francisco. Ele vive em voce... Fico impressionado como o carisma franciscano é tão vivo na sua vida. Sua alegriaa e seu amor é contagiante. Tenho certeza que quando chegares ao Paraíso, o Poverello di Assisi estará na porta para te receber...
    Laudato si... Pace e bene.

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  2. Omena, muito agradecido por suas palavras. Quem dera Francisco me recebesse.

    Paz e Bem,
    Claudio.

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