Vou me deter na análise da Carta
Encíclica do Papa Francisco, que assim se apresenta – Laudato Si (Louvado seja) -, atendendo a sugestões de pessoas
amigas, nesse sentido.
Marcando que esse escrito é
instrumento de “diálogo com todos acerca da nossa casa comum”
(Laudato Si – pg. 4, grifei), Francisco reafirma seu testemunho concreto de
oferecer-se a mulheres e homens de todos os credos religiosos, ou sem credo
algum, em perene empenho de ouvir e dizer, ou seja, de dialogar, sem
preconceitos ou predisposições.
Relembra-nos sábias palavras do Papa
Paulo VI, em discurso na FAO (Food Alimentary Organization), por ocasião do 25º
aniversário desse importante organismo da ONU (Organização das Nações Unidas),
proferidas há 45 anos, e completamente confirmadas nos dias de hoje. Disse, e é
de se repetir, Paulo VI da possibilidade de uma “catástrofe ecológica sob o
efeito da explosão da civilização industrial”, proclamando:
“a necessidade urgente de uma mudança radical no
comportamento da humanidade, porque os progressos científicos mais
extraordinários, as invenções técnicas mais assombrosas, se não estiverem unidos a um progresso social e moral, voltam-se
necessariamente contra o homem.” (leia-se: Laudato Si – pg. 4/5).
No magistério do Papa
Bento XVI, o Papa Francisco alerta-nos para o grave equívoco que perpetramos.
“O Papa Bento XVI propôs-nos reconhecer que o ambiente
natural está cheio de chagas causadas pelo nosso comportamento irresponsável: o
próprio ambiente social tem as suas chagas. Mas, fundamentalmente, todas elas
ficam a dever ao mesmo mal, isto é, à
ideia de que não existem verdades indiscutíveis a guiar a nossa vida, pelo que
a liberdade humana não tem limites. Esquece-se que o homem não é apenas uma liberdade que se cria por si própria. O homem
não se cria a si mesmo. Ele é espírito e vontade, mas também é natureza.
Com paterna solicitude, convidou-nos a reconhecer que a criação resulta comprometida onde nós somos a última instância,
onde o conjunto é simplesmente nossa propriedade e onde o consumimos somente
para nós mesmos. E o desperdício da criação começa onde já não reconhecemos
qualquer instância acima de nós, mas vemo-nos unicamente a nós mesmos.”
(leia-se: Laudato Si – pg. 7, grifei).
“Ver-se unicamente a si mesmo” é a razão de ser da corrupção: tudo,
em nós, centralizamos; de todos, a nós, impomos reverência, subjugação,
bajulação.
A administração da polis (= cidade), a política,
completamente distorcida de sua relevante razão de ser, exalta-nos no poder pelo poder, instrumentalizado
na compra e venda de espúrias negociatas. O bem comum, o cuidado com a casa
comum são expressões extintas, ou manipuladas por agentes públicos, que se
fazem “última instância”, onde tudo
lhes pertence, para que de tudo possam consumir, exclusivamente.
Essa concepção ufanista
é medíocre como, aliás, são todas as concepções ufanistas.
É medíocre porque
completamente incapaz de perceber a sacramentalidade do mundo, na partilha sem
fronteiras.
Eis porque o Papa
Francisco brinda-nos com palavras do Patriarca Ecumênico Bartolomeu, carregadas
de sentido, e de poesia:
“... aceitar o mundo como sacramento de comunhão, como forma
de partilhar com Deus e com o próximo em uma escala global. É nossa humilde convicção que o divino e o humano se encontram no
menor detalhe da túnica inconsútil da criação de Deus, mesmo no último grão de
poeira de nosso planeta.” (leia-se: Laudato Si – pg. 9/10).
Com essa transcrição,
preparada está, em absoluta coerência, a reflexão que o Papa dedica a São
Francisco de Assis, no contexto de sua Carta Encíclica. Ele diz:
“Acho que Francisco é o exemplo por excelência do cuidado
pelo que é frágil e por uma ecologia integral, vivida com alegria e
autenticidade.” (leia-se: Laudato Si – pg. 10).
Sim, eis a
palavra-chave, para mim, de todo o ensinamento evangélico: cuidar.
O Deus-Amor, Jesus, o
Cristo (= ungido) ensinou-nos e ensina-nos que amar é cuidar: acolhendo; sentando-se à mesa com; caminhando com;
enfim pondo-se em comunhão. Toda comunhão é ato-momento de deixar-se cuidar por Deus para por-se a cuidar da irmã e do irmão.
Colho ideia tão
apropriada do Papa Francisco, a propósito:
“A pobreza e a austeridade de São Francisco não eram
simplesmente um ascetismo exterior, mas algo mais radical: uma renúncia a fazer da realidade um mero objeto de uso e domínio.”
(leia-se: Laudato Si – pg. 12 grifei).
E, outra passagem, em
sintonia fina com a que venho de transcrever:
“O mundo é algo mais do que um problema a resolver; é um mistério gozoso
que contemplamos na alegria e no louvor.” (leia-se: Laudato Si – pg. 12/13,
grifei).
Crises,
não há porque temê-las. Faz-se mister que existam. Hão de ser vistas como
desafios a que melhor nos conheçamos, portanto, a que descubramos nossa verdade
comum, construída a cada dia, com o concurso de todos.
Encerro
este artigo com consideração final, posta em esperança, com que o Papa
Francisco termina a apresentação, tão rica em ensinamentos da Laudato Si. Disse o Papa Francisco, em
apelo:
“Espero que esta carta encíclica, que se insere no magistério social da
Igreja, nos ajude a reconhecer a grandeza, a urgência e a beleza do desafio
que temos pela frente.” (leia-se: Laudato Si – pg. 14).
No
artigo do próximo mês, concedam-me, amigas leitoras e amigos leitores,
continuar conversando com vocês sobre tão fundamental Documento.
2 comentários:
Muito bom. Claudio, acho que deveria escrever um livro sobre São Francisco. Ele vive em voce... Fico impressionado como o carisma franciscano é tão vivo na sua vida. Sua alegriaa e seu amor é contagiante. Tenho certeza que quando chegares ao Paraíso, o Poverello di Assisi estará na porta para te receber...
Laudato si... Pace e bene.
Omena, muito agradecido por suas palavras. Quem dera Francisco me recebesse.
Paz e Bem,
Claudio.
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